Tipos Populares de Maceió II

Publicado na revista Mocidade de maio/junho de 1949

Panelas de Barro no Mercado de Maceió. Foto Luiz Lavenère

Félix Lima Júnior

Maria Rosa

Rua do Comércio esquina com a Praça dos Martírios e a famosa Porta da Chuva

Tipo popularíssimo em Jaraguá, vendia amendoim, frutas e cocadas num tabuleiro, na esquina da rua Sá e Albuquerque com a praça da Recebedoria. Preta retinta, andava sem casaco, com uma camisa muito enfeitada de rendas e um chalé de cores vivas. A camisa era excessivamente decotada, pois ela desejava parecer baiana… Quando havia vapores no porto ela mudava o tabuleiro para a entrada da ponte de desembarque. Dava umas gargalhadas escandalosas e vez por outra soltava uma dúzia de palavrões capazes de fazer corar um Buda de pedra… Em uma das suas edições o Bacurao contou que Mr. Paton, gerente do Banco Inglês fizera um contrato original com a Maria Rosa: nem o Banco venderia amendoim e cocada, nem ela emprestaria dinheiro a pessoa alguma…

João Firmino da Assunção

Conheci-o em 1918, carteiro dos Correios, residindo em Bebedouro, onde faleceu. Era muito gordo e o seu estômago parecia não ter fundo… Certo dia do ano de 1909, depois de ter almoçado, comeu uma jaca, 2$000 de cocada e bebeu uma quartinha d’água, isso por ter certa pessoa duvidado da capacidade do seu estômago e se prontificado a pagar a despesa… Note-se que 2$000 de cocada, naquele tempo, dava para um farto lunch aos 50 alunos do Liceu Alagoano.

Lúcio Suteriano

Homem de idade muito avançada, era veterano do Paraguai, pau d’água habitual e monarquista de quatro costados. Com motivo e sem motivo, em qualquer dia e a qualquer hora, ao chegar a uma esquina, pronunciava, sem que ninguém pedisse ou esperasse, violentos discursos defendendo a monarquia e atacando a República… Ao que me informam faleceu há mais de 40 anos.

Pacífico Pacato Cordeiro Manso

Poeta popular, pelo nome não se perdia… Escrevia uma versalhada incrível, comentando os acontecimentos da cidade, principalmente os que se relacionavam com a política. Mandava imprimir e vender seus folhetos pelas ruas e no Mercado Municipal, ao domingo. Noivou com uma distinta senhorita de tradicional família alagoana, e não sei bem se chegou a casar-se. Creio que não. Morava lá para as bandas do Prado e de há muito repousa no velho cemitério de Nossa Senhora da Piedade.

Antônio Alves Carneiro

Vendedor de água no Largo dos Martírios em 1905. Foto de L. Lavenère

Explorou, durante muitos anos, um compartimento de frutas e verduras no Mercado Municipal. Ficou amalucado, tendo ido para o Rio de Janeiro, onde foi internado no Hospício Nacional dos alienados, na Praia Vermelha. Melhorou, regressou a Maceió, arvorando-se em “dono” do Banco do Brasil

Todos os dias, chovesse ou fizesse sol, antes de ser aberta a porta da agência do velho instituto de crédito, lá estava o Carneiro. Só saía quando terminava o expediente. Dizia ser dono do banco, onde tinha um depósito, mais de 80 mil contos, herança da mãe dele… Prestava pequenos serviços aos funcionários e recebia um níquel de um e de outro.

Com esse dinheiro e com as facadas que aplicava ia vivendo. Vez por outra, em certas épocas da lua ou quando bebia demais, exaltava-se e pintava o diabo… Terminada a carraspana ou passada a fase da lua voltava a ser calmo, atencioso, exibindo a todo mundo velhas cadernetas de depósitos bancários já liquidados ou fac-símile de cheques que lhe davam e ele considerava parte de sua fortuna… Faleceu há uns 6 anos passados, sendo as despesas do enterro custeadas pelos funcionários do Banco.

O Prisco

Estafeta do Telégrafo Nacional, chamava-se João Prisco do Rego, sendo apontado — e com razão — como o indivíduo mais magro de Maceió. Faleceu há uns dois anos passados.

Elias

Morava na rua do Açougue, hoje avenida Moreira Lima, e costumava tomar sua caninha na mercearia que o sr. Honório Albuquerque, pai do Padre Júlio de Albuquerque, mantinha na aludida rua, esquina com a da Boa Vista, onde está hoje a “Casa das Linhas”. Muito malcriado, tinha verdadeiro horror a bombas e busca-pés, sofrendo bastante pelo São João.

Não respeitava pessoa alguma e só obedecia à sua velha mãe. Com fino espírito e muita ironia, costumava dizer:

— “Em Maceió entram, todos os anos, cem pipas de cachaça. Eu bebo uma, garanto! Não sei, porém, quem bebe as outras… Entretanto somente eu sou apontado como cachaceiro… Está direito isso?”

Japiassú

Foi fiscal da Intendência Municipal de Pilar, atual Manguaba, e vivia com os bolsos cheios de “bolas” para matar cachorros, o que lhe valeu tantas pragas que ficou amalucado. Aposentou-se, vindo residir em Maceió, onde ainda o conheci em 1910. Era um dos maiores “chaleiras” (naquele tempo não se falava ainda em gafanhoto…) do governador Euclides Malta. Não largava um porrete e vivia pelas ruas afirmando a propósito de tudo e sem propósito algum: — Deus, Dr. Euclides e minha filha Marieta…

Faleceu há uns 30 anos passados. Um jornal da capital, que só podia ter sido o “Correio de Maceió”, que fazia oposição e era dirigido pelo dr. Fernandes Lima, publicou, certa ocasião, a seguinte quadrinha pilheriando com o Japiassú, que vendera uma perua que estava cevando para o Natal a fim de jogar no peru, animal com que sonhara:

Tendo vendido a perua
Para jogar no peru,
Chora hoje o dia inteiro,
O pobre Japiassú…

É que o bicho do dia tinha sido outro e ele perdera a perua e o dinheiro…

Fausto Feitosa

Casa comercial na Rua do Comércio em Maceió

Era um homem alto, forte, gordo, de fala grossa e ignorância de pasmar. Explorava uma vacaria perto da praia do Sobral. Adquiria, para seu uso, animais e objetos de tamanha fora do comum. Tinha um cavalo enorme, conhecido em toda a cidade, como o “cavalo do Fausto”. Usava um relógio enorme, que rasgava os bolsos do paletó.

Comprou um reprodutor zebu, do tamanho do cavalo celebrizado… E assim por diante… Quando se vulgarizou, em Maceió, o rádio, ele, ao lhe ser mostrado um aparelho receptor, disse, desconfiado: “Homem, esse bicho pode ser ouvido até a Paraíba. Para lá, não…”. Certa ocasião, conversando com o sr. Jorge Magalhães da Silveira, na minha presença, disse que ia realizar um negócio com a Great Western, para fornecer um milhão de dormentes.

O sr. Silveira, espantado e achando muito grande a quantidade, perguntou ao Fausto:

— O sr. sabe, “seu” Fausto, quanto é um milhão?

Ele não se atrapalhou e respondeu imediatamente:

— Se sei, “seu” Zeca! É dez mil multiplicado por dez…

1 Comentário on Tipos Populares de Maceió II

  1. Claudevan melo // 22 de abril de 2019 em 20:20 //

    Maravilhosos enriquecedoras postagens

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