Manoel Mendes da Fonseca
Chefe de uma família de heróis e deputado em três legislaturas provinciais
Mendes da Fonseca entrou para a História do Brasil como o homem que lançou um manifesto de Independência do País, antes do Grito do Ipiranga; como um lutador irreverente que tentou impedir a transferência da capital, de Alagoas (atual Marechal Deodoro) para Maceió, como pai de uma prole de heróis que dignificaram a pátria na sangrenta Guerra do Paraguai e também como pai do Proclamador da República Brasileira e seu primeiro presidente republicano.
Em sua trajetória de lutas encontra o apoio seguro e o incentivo de sua esposa – dona Rosa da Fonseca — uma mulher destemida, forte, que se propunha a dar, até mesmo, a própria vida, no sentido de tornar a pátria livre, independente e, sobretudo, democrática.
Família de vocação militar
O pai do vulto focalizado — Manoel Mendes da Fonseca Galvão — possuía prenome e sobrenome absolutamente iguais aos do filho; se acaso fosse em data mais recente, ao sobrenome do filho, certamente acrescentar-se-ia o termo Filho ou Júnior, para diferençar do pai ou, ainda, demonstrar a sua ascendência.
Manoel Mendes, o pai, veio para Alagoas, procedente de Pernambuco; a sua vinda foi motivada pela amizade com os primeiros membros da família em Satuba e Santa Luzia do Norte, fazendo residência no Sítio Cruaranha, situado a uma légua de Anadia, onde foi negociante e estabeleceu escola de primeiras letras, mediante contrato com o capitão Baltazar Barbosa Lobo e Gaspar Barbosa Lobo, ligados àquelas famílias por laços matrimoniais.
Mendes (o pai) casa-se com D. Maria Mendes, irmã mais velha da mãe do tenente Francisco Mendes da Canabrava dos Pais. Do casório teve um único filho, nascido em Anadia, aos 24 de julho de 1785, a quem pôs o nome em forma homográfica.
O filho, Manoel Mendes, “sentou praça” no Regimento de Infantaria de Unha, no Recife, no dia 25 de setembro de 1806, contando, na época, com vinte e um anos de idade. Nessa época, deixou de usar o último sobrenome Galvão, ficando apenas com o Fonseca, que o tornaria conhecido na História.
Em 1817, Mendes já era capitão e foi encarregado pelo general Luiz do Rego, governador da Capitania de Pernambuco, de vir a Alagoas para armar os seus habitantes, pondo-os em estado de defesa. Para a execução da tarefa, foram entregues a si quatro canhões, dois obuseiros com as suas munições.
No dia 28 de junho de 1822, Mendes, insatisfeito com a política de Portugal em relação ao Brasil, lançou, antes do Grito do Ipiranga, aqui mesmo na Cidade de Alagoas, o Manifesto da Independência, defendendo-a e lutando por ela.
Contraditoriamente, tinha pelo Imperador D. Pedro I verdadeira admiração e obediência tanto que, ao chegar a Maceió, a notícia do dia 30 de abril de 1831 — a abdicação do monarca — inúmeros dos simpatizantes daquela autoridade foram perseguidos; alguns tiveram que fugir, evadindo-se rápido, deixando para trás os bens que acumularam. Era o período chamado de “Mata, Mata Marinheiros” ou de “Marinheiro Pé-de-Chumbo“.
Mendes, por sua vez, foi suspenso do comando do 11° Batalhão de Infantaria, sendo pronunciado, ou processado, mas com o passar do tempo, foi reconduzido ao Batalhão.
Na data de 9 de dezembro de 1824, na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, da Cidade de Alagoas, Manoel Mendes casa-se com D. Rosa Maria Paulina de Barros Cavalcante, sendo testemunhas do enlace Dr. Gustavo Mello de Aguiar e o comandante das Armas Joaquim Mariano de Oliveira Bello, chefe do major Mendes, do qual era seu secretário. A cerimônia foi oficiada pelo Pe. Antonio Gomes Coelho Mello.
A esposa e companheira: Rosa da Fonseca
Com o casamento, realizado em 1824, na Cidade de Alagoas, recebeu o nome de Rosa Maria Paulina da Fonseca, tornando-se, assim, a senhora Mendes da Fonseca.
Nascida em 18 de outubro de 1802, a história não guarda a informação se o fato ocorrido, teria sido em Anadia ou na Cidade de Alagoas.
A questão por que teria Manoel Mendes deixado de usar o sobrenome Galvão, pode agora ser respondida. É que a sua família da parte dos Galvão, de grande projeção social, não concordou com o casamento de Manoel com Rosa, pois dizia a tradição que a noiva descendia de escravos, tinha sangue indígena em suas origens e vivia na Cidade de Alagoas, sem comportamento conveniente para uma moça, como montar a cavalo em pelo, disparar pelas ruas da cidade e nadar nas lagoas.
Ademais, os pais de Rosa eram desconhecidos; os historiadores atribuem a D. Antônia Maria de Barros, falecida aos oitenta e seis anos de idade, no dia 5 de abril de 1860, ter sido sua genitora. [Informação confirmada pelo convite para a missa fúnebre de Antonia Maria de Barros publicado no Correio Mercantil de 10 de abril de 1860. Editoria do História de Alagoas].
A jovem altaneira também é possuidora de espírito religioso aguçado, tanto que em 10 de julho de 1830, Rosa ingressa na venerável Ordem Terceira de Nossa Senhora do Monte Carmelo, professando votos.
Deputado provincial
Por sua liderança e espírito empreendedor, Mendes foi eleito para o cargo de deputado pela Assembleia Provincial de Alagoas, Casa que corresponde à atual Assembleia Legislativa. Exerceu o cargo nas legislaturas seguintes: na primeira Legislatura (1835-1837) assume na qualidade de suplente, na segunda Legislatura (1838 -1839), como titular e, na terceira Legislatura (1840 -1841), também como titular. Portanto, exerceu o mandato de deputado durante seis anos. De sua atuação parlamentar nada podemos comentar, pois faltam os arquivos necessários.
No governo do presidente da Província Agostinho da Silva Neves (18 de abril de 1838 a 10 de fevereiro de 1840) aumentam as rivalidades entre a decadente e sem futuro Cidade de Alagoas (atual Marechal Deodoro) e Maceió, vila de grande prosperidade, sobretudo pela presença do Porto de Jaraguá, o melhor de Alagoas.
Rivalidades e lutas aumentavam amiúde e sinalizavam possível transferência da Capital para Maceió, sob a acirrada oposição dos habitantes da velha Capital, liderada por Manoel Mendes e por seu correligionário, o polêmico Dr. José Tavares Bastos, pai do estudioso Aureliano Cândido Tavares Bastos.
O presidente Neves mandou, em outubro de 1839, fazer a execução da Ordem do Tesouro Imperial, transferindo para Maceió o cofre da Tesouraria Geral.
Ao ato do presidente, correspondeu a ira do povo, tendo à frente Manoel Mendes e sua tropa. Silva Neves foi preso no Palácio e deposto em fins de outubro de 1839 e colocado para embarcar no dia 2 de novembro na sumaca “Dois Amigos“, para aportar em qualquer parte do Brasil, menos na Província de Alagoas.
Graças a um estratagema de Sinimbu, Neves ao se afastar do Porto do Francês, onde embarcara, mandou o mestre rumar para Maceió, onde desembarcou e reassumiu o Governo.
Nula a deposição, o presidente volta à Capital, exonerando Mendes da Fonseca do cargo de juiz municipal, que fugiu para Sergipe, apresentando-se em 3 de dezembro ao comandante das Armas daquela Província, que o prendeu e o enviou para a Corte, onde ficou detido na Fortaleza de Santa Cruz e, só em maio do ano seguinte, foi julgado pelo Conselho de Guerra, sendo absolvido e reconduzido às tropas.
Dada a situação de enormes dificuldades existentes para cuidar da família, Mendes resolveu, em 1857, comunicar ao Imperador a sua situação, tentando resolver ou, pelo menos, minorar ou aliviar os problemas, diz a carta:
“Minha família, coitada, sempre mantida pelo apertado repuxo, já não de justas economias, mas de dolorosas misérias, nunca comeu mais que o necessário para não morrer de fome, nunca trajou luxo, ainda não viu as paredes internas de um teatro, nunca foi mesmo a um baile dos muitos concorridos nesta Corte, onde vivemos há quinze anos, em nímio rigor da vida.”
Dois anos depois, em 24 de agosto de 1859, com 74 anos de idade e reformado como tenente-coronel, Manoel falecia no Rio de Janeiro, deixando a viúva e vários filhos.
Os horrores da guerra e a bravura da mãe
Após a morte de Manoel, D. Rosa, exemplo de bravura de mulher alagoana, com entusiasmo educou todos os filhos. No início da Guerra do Paraguai, D. Rosa da Fonseca possuía sete filhos nas trincheiras, quando recebeu a dolorosa notícia que dois de seus filhos tombaram mortos — capitão Hipólito e o alferes Afonso — a mãe cedeu lugar à patriota, pois sentiu que seus filhos serviram bem a pátria.
Na passagem de Itororó, D. Rosa, mais uma vez, teve o coração ferido, pois perdera mais um filho — major Eduardo Emiliano — e dois outros — Hermes e Deodoro – foram gravemente feridos.
Quando se tentou falar de paz com o ditador do Paraguai, a abnegada e patriota D. Rosa dizia aos amigos: “Prefiro não ver mais meus filhos; que fiquem todos sepultados no Paraguai, com morte gloriosa no campo de batalha do que enlameados por uma paz vergonhosa para a nossa Pátria.”
Ao chegar à casa de D. Rosa da Fonseca um oficial em nome do Imperador para apresentar pêsames à nobre senhora, ficou admirado, pois a senhora o recebeu calma e impassível e com a casa embandeirada e iluminada. A nobre senhora respondeu ao oficial que a vitória que a pátria alcançara, valia muito mais que a vida de seus filhos.
O oficial curvou-se, e comovido, beijou a mão daquela excelsa senhora, que lhe parecia a encarnação da própria Pátria. Estampada na revista Semana Ilustrada apareceu, na edição de 28 de agosto de 1865, um soneto atribuído a Rosa da Fonseca; ei-lo:
“Cala-te amor de mãe! Quando o inimigo
Pisa da nossa terra o chão sagrado.
Amor da Pátria, vivido, elevado
Só tu na solidão serás comigo!
O dever é maior do que o perigo.
Pede-te a Pátria, cidadão honrado.
Vai meu filho, e nas lides do soldado
Minha lembrança viverá contigo!
És o sétimo, o último. Minh’alma,
Vai toda aí, convosco repartida
E eu dou-a de olhos secos, fria e calma.
Oh! Não te assuste o horror da mareia lida,
Colhe no verde campo a melhor palma
Ou morte honrada ou gloriosa vida.”
As homenagens
A Manoel Mendes da Fonseca foi prestada uma homenagem pelo povo alagoano, seu nome foi dado a uma rua, no Centro de Maceió, de acordo com a Lei n° 53, de 2 de março de 1899. Percebe-se que seu nome só foi lembrado, quando seu filho assumiu a Presidência da República, por ele proclamada.
De acordo com a mesma lei votada na época do Intendente da Capital Demócrito Gracindo, o Conselho Municipal deu o nome de D. Rosa da Fonseca à antiga Praça do Livramento, Centro de Maceió, colocando um busto retratando o seu perfil, feito em São Paulo pelo artista italiano Angioli, e o interessante é que o busto da venerada senhora saiu praticamente de graça, pois foi feito com material que sobrou da estátua de Marechal Deodoro, isso deu motivo a surgir o artigo de Humberto Vilela, de título: “A mãe que nasceu do filho“.
Na época em que o estudioso Ernani Mero dirigia o Departamento de Assuntos Culturais resolveu retirar a estátua de D. Rosa do local onde se encontrava, pois estava situada praticamente dentro do Bar do Chopp. Ernani fez a transladação do busto para a casa onde a heroína residiu: Rua dos Mortos, em Marechal Deodoro, onde existe um pequeno museu velando pela lembrança positiva dos familiares desses fazedores de um Brasil grande e íntegro.
Fonte: texto e pesquisa de José Maria Tenório Rocha, publicado originalmente em Memórias Legislativas, em 15 de março de 1998.
Ticianeli. muito bom seu trabalho, principalmente quando você diz que os pais de dona Rosa eram desconhecidos. É isso mesmo. Alguns “historiadores” dizem que dona Rosa era filha de José de Carvalho Pedrosa. Não Era. Veja o casamento de José de Carvalho Pedrosa:
Aos dezoito de fevereiro de mil oitocentos e treze na capela de Santa Rita nova, em presença do padre Manoel Teixeira Pinheiro, de licença minha, sendo Testemunhas, José Francisco Salgueiro e Miguel Antônio Esteves, casados, ambos desta Freguesia, se receberam em Matrimônio na forma do Sagrado Concílio Tridentino, corridos os banhos sem impedimento , tendo o contraente justificado menoridade em que veio de sua natural Freguesia, o Contraente José Carvalho Pedrosa com a contraente Ângela Custódio do Nascimento; ele natural da Freguesia de São Julião do Calendário do Arcebispado de Braga, filho de Domingos Carvalho e Maria Narciza; ela natural desta freguesia, filha de Antônio Carvalho Monteiro e Joana Francisca. O mesmo padre lhes deu as bênçãos e eu fiz este assento. O Vigário Antônio Gomes Coelho.
OBS.: dona Rosa da Fonseca nasceu em 1802 e José Carvalho Pedrosa casou em 1813. Então, quando dona Rosa nasceu José de Carvalho Pedrosa tinha no máximo 7 anos e residia em Portugal.. Seria totalmente impossível o mesmo ser pai de Dona Rosa
Gostaria de agradecer a todos vocês, pois é da minha família que estão falando, é muito bom saber da nossa própria história!
Muito Obrigada! 😀
Orgulho me em saber q D. Rosa era minha parenta (Cavalcante)… bela triste historia.
Há uma confusão de personagens no texto; confundido o pai, Manoel Mendes da Fonseca Galvão, com o filho Manoel Mendes da Fonseca Galvão (depois Marechal Deodoro da Fonseca – sem o “Galvão” após casar-se). E a data de 1817?
Desculpem a postagem anterior, confirmei os dados e as datas, estão corretos.
E das filhas ou irmãs dos militares nada se fala ou se sabe?
Não há registros das atividades delas nos jornais ou escritos da época. Raras foram as mulheres daquele período da nossa história que conseguiram notoriedade. Caso tenha algum indicativo sobre essas informações, aceitaremos de bom grado que nos repasse.
Boa tarde, alguém teria o nome dos netos de dona Rosa Maria Paulina da Fonseca