Hélio Careca Lessa: o criador do “Ronda Policial” relembra o tempo da Boca da Bigorna
Publicado originalmente na revista Última Palavra, Ano 2, nº 68, de 9 a 15 de junho de 1989
Quando em 1948 Alagoas deixava de ser a zona do silêncio e ingressava na era do rádio com a inauguração da ZYO-4 (a Rádio Difusora), começava também a surgir uma nova oportunidade de trabalho para um garoto de 16 anos, de nome Hélio Lessa Silva, que naquele ano deu início a sua carreira de profissional do rádio, fazendo parte de um dos programas de auditórios da Difusora, ao lado de Benedito Alves, formando a dupla conhecida como os “Irmãos Edson”.
De cantor nos programas de auditórios, Hélio Lessa passou ao jornalismo, trocando de setor ao mesmo tempo que a Rádio Difusora se transferia do antigo prédio localizado na rua Pedro Monteiro, para um outro casarão, na Praça dos Martírios, onde hoje funciona o museu da Fundação Pierre Chalita.
Nesta época, o departamento de jornalismo da Difusora era dirigido por Jucá Santos, lembra Hélio Lessa, que ao lado de Wegand Mansur lançou o programa “Ronda Policial“.
Em sua versão original, criada ainda na década de 60, o programa deu ao seu apresentador uma grande popularidade além da alcunha de “Hélio Careca Lessa – o homem da calça preta“.
Muito chegado a uma “cachacinha”, Hélio Lessa preparava o seu programa naquele lugar, que ele chamava de “Boca da Bigorna“. “A boca da bigorna era o conhecido lixo da Levada, um antro de marginais e prostitutas, que funcionava como uma espécie de meu quartel general”. Explica com bom humor Hélio, acrescentando que naquele local ele tinha contato com suas fontes, comandando uma equipe de quatro repórteres.
O lugar que Hélio Lessa frequentava, e que ele chamava de “Boca da Bigorna”, era onde hoje funciona o Mercado da Produção.
Ali se reunia toda sorte de marginais, que entre goles de raiz-de-pau (cachaça curtida em raízes) desfilavam suas últimas conquistas.
Era nesse local que o repórter colhia as informações que iam rechear suas estórias cheias de humor, retratando o drama dos “ladrões de galinhas” e das mariposas.
“Na boca da bigorna era muito melhor de colher uma informação do que na porta de qualquer delegacia“, conta Hélio que também apreciava uma raiz-de-pau, “com tira-gosto de passarinha“, frisa ele.
Nu de pileque
A relação entre Hélio Lessa e a bebida gerou muitos fatos pitorescos, mas ele desconversa quando perguntado. “Hoje eu não bebo mais, abandonei esse vício, graças a minha força de vontade e à interferência de uma mãe-de-santo do Rio Novo”, explica Hélio.
Alguns amigos seus contam a versão verdadeira: Hélio abandonou a bebida depois que tomou um grande “pileque” que o deixou sem suas roupas.
“Ele tinha o costume de quando faltava dinheiro durante um porre, trocava por cachaça até mesmo a roupa em que estava vestido”, contou uma fonte que não quis revelar seu nome, acrescentando que depois que chegou em casa enrolado em páginas de jornais, Hélio Lessa resolveu abandonar a bebida.
Se esta versão é verdadeira, ou se não passa de uma história folclórica, que os amigos inventaram para ilustrar mais ainda a engraçada vida deste repórter de 56 anos de idade, somente o próprio Hélio poderia confirmar.
Hélio Lessa diz que o programa “Ronda Policial”, que era feito por ele na década de 60, misturava fatos policiais com humor.
Dizendo sempre preferir a versão dos acusados à da polícia, o repórter preparava estórias engraçadas, envolvendo os marginais e a polícia; num verdadeiro teatro radiofônico.
“O meu programa não tinha sangue nem violência, nós fazíamos um programa de polícia, onde se destacava o aspecto pitoresco do fato policial”, explica Hélio, que com o seu estilo ganhava a simpatia dos marginais, que sempre estavam a sua disposição para oferecer informações.
A popularidade da versão original do programa “Ronda Policial” é atestada pelo comerciante Leonardo da Silva, que na época era proprietário de um serviço de alto-falante, que funcionava no antigo mercado público de Maceió.
Através do serviço de alto-falante Padre Cícero, o programa “Ronda Policial” era retransmitido simultaneamente, aglomerando ao seu redor centenas de populares, que diariamente, no horário do almoço, se reuniam para ouvir as “estórias” do Hélio Careca Lessa.
Respeito ao marginal
Elinaldo Barros, diretor do Museu da Imagem e do Som de Alagoas, destaca o caráter hilariante com o qual Hélio Lessa tratava os casos policiais.
“Eram estórias engraçadíssimas, que ao mesmo tempo informavam de uma realidade de Maceió, com seus ladrões de galinhas e suas mariposas”, afirma Elinaldo, destacando ainda que na “Ronda Policial” do tempo do Hélio Careca Lessa os marginais eram respeitados enquanto pessoas humanas, vítimas das mazelas de uma sociedade extremamente desigual.
“E além de tudo, o Hélio é uma pessoa de espírito muito rico e alegre“, acrescenta Elinaldo, que também trabalha como crítico de cinema. “Ele sempre me encontra na rua para comentar algum filme e fazer elogios ao cinema americano”, lembra Elinaldo.
Esse espírito humanitário do repórter Hélio Lessa era transmitido para o seu programa policial onde sempre acontecia campanha de donativos para famílias carentes.
“Eu sempre anunciava uma campanha de solidariedade para alguma pessoa necessitada”, explica Hélio, que também levava ao seu programa marginais que se regeneravam.
“Para mim o bandido, em primeiro lugar é uma vítima da sociedade, é uma pessoa humana, e como tal, merece o meu respeito. Nos meus programas nunca procurei diminuí-los, mas sempre colocá-los como alguém que estava infringindo as regras sociais”, explica o repórter.
A “Ronda Policial” de Hélio Lessa sobreviveu por um bom tempo entre as rádios Difusora e Palmares, até que Hélio se afastou do rádio.
Depois de sua experiência com a “Ronda Policial” Hélio resolveu abandonar o jornalismo e enveredou pelo caminho da realização de concursos de garota propaganda.
Agora, o repórter começa a apostar em sua volta aos velhos tempos. Com um projeto na mão, Hélio diz pretender realizar um programa que dará destaque a um roteiro de músicas tipicamente nordestinas.
O novo projeto de Hélio Lessa já tem até nome e horário para a sua realização. — “Meu programa vai se chamar “Onde Canta o Sabiá” e pretende ser uma homenagem à radialista Odete Pacheco e será apresentado de segunda a sexta no horário das 6 da manhã”, revela Hélio, acrescentando que seu programa terá concursos de poesias matutas, apresentação ao vivo de violeiros, anúncios de simpatias e um repertório musical bem regional. “Não vou tocar nada de forró moderno, porque isso não é música nordestina”, sentencia. Hélio Lessa.
Bom, não sei se ainda tá vivo, mas Hélio sempre foi um batalhador e morou em Cruz das Almas por um bom tempo.
Élio Careca Lessa faleceu já, há muitos anos!
Helio careca lessa Faleceu ja um bom tempo , sou neta dele