Apontamentos sobre o piano em Alagoas

Publicado originalmente na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas 1982/83

Moacir Medeiros de Sant’Ana

Antônio Alves, jornalista alagoano, em trabalho de 1896, asseverou que “Alagoas (atual Marechal Deodoro) teve a honra de possuir o primeiro piano que apareceu na Província. Era de mesa, pequeno formato, de cinco oitavas ou pouco mais. Esse piano foi mandado vir por Manoel do Nascimento Pontes para suas filhas Tereza e Maria, as quais tiveram um professor contratado em Pernambuco”. (1)

Salão de Música do Palácio dos Martírios em 1908

Como as filhas do casal Manoel do Nascimento Pontes e Adriana Maria Pontes, Maria e Tereza, nasceram na antiga capital alagoana, respectivamente, a 20 de junho de 1821 e 14 de outubro de 1822, (2) é de presumir que tal piano possivelmente tenha chegado a Alagoas, no período de 1830 e 1840, quando elas contavam entre 9 e 18 anos de idade.

Seria, portanto, muito anterior ao que se afirma haver sido adquirido, em 1869, pelo professor Domingos Moeda, casado em 1867, pai da pianista e compositora Maria Moeda Bitencourt, conhecida como Mocinha Moeda, irmã de outra musicista conterrânea, Ana Moeda Bitencourt.

De setembro de 1857, outra referência, indireta, a respeito da existência de piano nas plagas alagoanas: o anúncio da venda, em Maceió, de “encordoações para piano (chegadas) à loja nº 46, da rua do Comércio” (3)

Conjunto musical feminino no Centenário de 1939, sob a regência do maestro Luiz Lavenère

No ano seguinte — 1858 —, em março, tais encordoamentos eram também vendidos no nº 39, da mesma rua, pelo negociante português José Gonçalves Guimarães, que meses depois, em maio, anunciava ter para vender bordões para aquele instrumento musical. (4)

Nesse mesmo mês de maio, periódico maceioense estampou o anúncio mais antigo, de que se tem notícia, da venda de piano em Alagoas, piano que, segundo seu proprietário, encontrava-se “em muito bom estado e por preço cômodo, na rua do Palácio, nº 9″, (5) da capital maceioense.

Ainda desse mês, é a notícia da existência de um periódico especializado, pouco conhecido, O Recreio das Jovens Pianistas, cujo local de impressão não vem declarado pelo seu diretor, Baldeino dos Santos e Oliveira, que anunciou, contudo, o aparecimento do 5º número do 2º trimestre, constituído de um “belo romance maceioense para canto e piano”, de autoria do compositor alagoano Joaquim Antônio de Almeida Crispim. (6)

Para piano, além de cordas e bordões, José Gonçalves Guimarães expunha ainda à venda, em seu estabelecimento comercial, no aludido mês e ano, um método em francês, de Henri Herz, e as partituras “Lira de Itália” e “Clemenza de Valois”. (7)

A venda de mais partituras “para piano e cantoria“, naquela casa comercial, vem anunciada no Correio Official, em número de novembro de 1860: “O retrato dos ingratos“, “Desejos de um rapaz de tom”, “A fita azul“, “Saudade”, “Eu quero me casar“, “Vasco da Gama”, e “O trovador“. (8)

Antigo piano

A existência, já nos meados do século XIX, de vários pianos em Alagoas, justificava a presença, na capital maceioense, de mestres de piano e afinadores, como Theodore Brusch, que em janeiro do ano de 1859 “(dava) lições de piano e (encarregava-se) de consertos e afinações dos mesmos”, em sua residência, na rua do Rosário, nº 9. (9) Ou, ainda, em maio seguinte, do mestre de piano Francisco Santini, “que se (achava) pronto a lecionar (piano) nas casas daquelas pessoas que de seu pequeno préstimo quisessem utilizar-se”, segundo divulgou em anúncio estampado pelo Diário das Alagoas, de Maceió, de onde consta sua residência, na rua do Comércio, nº 53, na casa do sr. Richard, relojoeiro francês. (10)

Em julho de 1860, André Alves da Fonseca Júnior, professor de música e de piano, há pouco chegado de Pernambuco, oferecia também seus préstimos, em Maceió, das 12 às 15 horas, em sua residência, “na rua do Comércio, contíguo ao sobrado do sr. Coutinho”. (11) No mês de agosto acrescentou, em novo anúncio, que igualmente afinava e consertava pianos “no mais arruinado estado que (estivessem)”, na rua Nova, nº 63. (12)

Na época, um dos mais ativos vendedores de artigos musicais, da capital alagoana, certamente era o já referido José Gonçalves Guimarães, que em outubro de 1859 anunciava a venda de “ramalhete de quadrilhas e contradanças modernas para piano, papel para música”, etc. (13)

Em Alagoas, também se fabricou piano, a exemplo do que ocorreu em Pernambuco. (14)

Isaac Newton de Barros Leite (1851-1907), professor de música e de piano, consertador e afinador desse instrumento musical, a 19 de setembro de 1907, treze dias antes de seu falecimento, em Maceió, aos 56 anos de idade, concluiu um piano de sua fabricação, inteiramente construído com madeiras das matas alagoanas. “Trabalho bem-acabado — segundo noticiarista da época — e no qual o seu autor imprimiu a mais correta perfeição”, foi exposto ao público em sua oficina, na rua do Livramento. (16)

Isaac Newton foi ainda autor de um Dicionário Musical, hoje obra raríssima, impressa em Maceió, na Tipografia Comercial, no ano de 1904.

_____________

(1) ALVES, Antônio. Notas de meu canhenho. Gutenberg, Maceió, 21 jan. 1896, p.

(2) FONSECA, Pedro Paulino da. Dicionário histórico, geográphico, biográphico, chronográphico e industrial da Província das Alagoas, ms do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas.

(3) O TEMPO, Maceió, 2 st. 1857, p. 4.

(4) DIÁRIO DAS ALAGOAS, Maceió, 20 mar. e 4 maio 1858, p. 4.

(5) IDEM, 15 maio 1858, p. 4.

(6) IDEM, 06 maio 1858, p. 3.

(7) IDEM, 22 maio 1858, p. 4.

(8) CORREIO OFFICIAL, Maceió, 19 nov. 1860, p. 4.

(9) DIÁRIO DAS ALAGOAS, Maceió, 05 jan. 1859, p. 4.

(10) IDEM, 26 maio 1859, p. 4.

(11) IDEM, 02 jul. 1860, p. 4.

(12) IDEM, 09 ago. 1860, p. 4.

(13) IDEM, 03 out. 1859, p. 4.

(14) DINIZ, Jaime C. Notas sobre o piano e seus compositores em Pernambuco. Recife, Ed. Coro Guararapes de Recife, 1960, p. 15.

(15) A TRIBUNA, Maceió, 20 set. 1907, p. 1, Noticiário.

3 Comments on Apontamentos sobre o piano em Alagoas

  1. João Evangelista Silva, especialista em Direito Processual. // 5 de novembro de 2018 em 22:33 //

    Não seja pelo simples fato de ‘arranhar” o teclado pianístico, desde os meus ingênuos 7 anos de idade, tendo me aperfeiçoado através da inesquecível professora Maria Augusta, na Fundação Teatro Deodoro e, não tão distante (anos 80), pelos catedráticos incentivadores à Intrepetação Pianística sob o incentivo das Pró-Retorias envolvidas(UFAL), enquanto universitáiro daquele “Campus” e, atualmente, contemplando os meus lúcidos 70 anos, me sinto plenamente realizado em dedilhar alguma coisa dos famosos métodos, como tal, festejando com júbilo àquelas memoráveis caminhadas, não tanto pelas dezenas de Certificados(Extensão) e o Diploma(Gaduação), mas pelo excelente eslito didático-musical dos meus saudosos instrutores. É o meu singelo comentário.

  2. João Evangelista Silva, especialista em Direito Processual. // 5 de novembro de 2018 em 22:48 //

    Em tempo: Louvo a grandeza e o apego varonil em torno do espirito coralista, do regente Beneito Fonseca, o qual será sempre lembrado, por todos os seus instruendos, colegas do magistério, funcionarios e admiradores na Terra dos Marechais.

  3. Jair Pimentel // 8 de novembro de 2018 em 16:23 //

    No livro Família Pimentel, da escritora e pianista Venúsia de Barros Pimentel Melo, é citada a existência do prrimeiro piano na zona rural de Alagoas, na casa grande do engenho Várzea do Souza, em Passo de Camaragibe, de propriedade do capitão José de Barros Pimentel, pai dos ex-governadores (presidente da Província) Esperidião e Ermelindo Acioly de Barros Pimentel. Em Viçosa, na segunda metade do século XIX, o maestro Nuno Moreira Pimentel, possuia piano, órgão, violino e foi o fundador da primeira escola de música da cidade, a euterpe Viçosense.

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