A Usina Uruba de Atalaia
Algumas publicações indicam que o Engenho Uruba, que deu origem à Usina do mesmo nome em Atalaia, Alagoas, teve como proprietário alguém da família Peixoto. Se isso aconteceu, foi por pouco tempo.
No livro Contribuição à História do Açúcar em Alagoas, do historiador Moacir Santana, consta a relação dos engenhos existentes em Atalaia no ano de 1849 e o Uruba não é citado nela. Também não há engenho algum cujo proprietário ostente o sobrenome Peixoto.
No mesmo livro, o Uruba aparece somente na relação dos engenhos existentes em 1859. Pertencia a Francisco de Borja Accioly e produzia entre 1.900 e 1.930 pães de açúcar. Como se percebe por estes dados, se houve algum Peixoto relacionado com esse engenho, isso aconteceu nos dez anos entre 1849 e 1859.
Atalaia tinha então 27 engenhos e os mais produtivos eram União, Cantinho, Cágado, Brejo, Anhumas e Uruba. Cada um deles colocava no mercado aproximadamente 2.000 pães de açúcar.
Segundo Thomaz do Bomfim Espíndola, na sua Geografia Alagoana, em 1871 a população de Atalaia era de 12.017 indivíduos, destes 1.515 eram escravos, a maior parte explorada nos engenhos.
Sobre Francisco de Borja Accioly, o proprietário citado na relação de 1859, sabe-se muito pouco. Era oficial da Guarda Nacional em Atalaia e entre 1877 e 1880 seu nome aparece no Almanak da Província das Alagoas como um dos vereadores da Freguesia de N. S. das Brotas, formada pelos povoados de Santa Efigênia ou Arasto, Capela com uma igrejinha, Cajueiro, Lourenço, Barra da Parangaba, Várzea com uma capela e Cabeça de Cavalo.
Entre 1883 e 1891 era também proprietário dos Engenhos Ingazeira e Água Dentro, no mesmo município de Atalaia.
Usina Santa Ismênia
Com a entrada em funcionamento, no dia 18 de janeiro de 1892, da Usina Brasileiro em Atalaia, primeira a adotar os chamados Engenhos Centrais, em pouco tempo outros empreendimentos tiveram a mesma iniciativa.
Esse impulso foi maior nas áreas atendidas pelas estradas de ferro, como Atalaia, que foi beneficiada pelo ramal da Alagoas Railway até Viçosa — ainda denominada como Assembleia —, entregue ao trafego em 24 de dezembro de 1891. O Engenho Uruba ficava a 3 km da Estação de Urupema e a 14 km do entroncamento em Atalaia.
Foi no período imediatamente posterior a esses acontecimentos que o Engenho Uruba trocou de proprietário e de nome, passando a ser a Usina Santa Ismênia. Quem o adquiriu foi o rico comerciante e industrial Tibúrcio Alves de Carvalho.
Não foi possível conhecer as bases da negociação, mas uma anotação de 1894, no Cartório do 1º Ofício de Registro Geral de Imóveis e Notas do Município de Atalaia, fornece uma pista:
“EXC-02 Execução Civil Nº 293: Tibúrcio Alves de Carvalho & Companhia (Executante) contra o Tenente Coronel Francisco de Borja Accioly, seus filhos e genros, João Lopes de Faria Lima e sua mulher; João Carlos Accioly; Antonio Carlos Accioly; Dioclécio Júlio Accioly; Joaquim de Borja Accioly; e José Daniel Pereira de Lucena e sua mulher (executados) em virtude de uma dívida no valor de 2.038.316,00 réis”.
Tibúrcio Alves de Carvalho Filho nasceu em 16 de fevereiro de 1864 e faleceu em fevereiro de 1919. Era filho do Comendador Tibúrcio Alves de Carvalho (recebeu a Ordem da Rosa em maio de 1885 e faleceu em 23 de agosto de 1885) e de Maria Alves de Carvalho (faleceu em 16 de julho de 1924).
O casal também trouxe ao mundo os seguintes filhos: Elisa de Carvalho Almeida Guimarães, casada com Américo Almeida Guimarães; Alfredo Álvaro de Carvalho (foi deputado federal junto com o irmão Tibúrcio), Carolina Carvalho Duarte, casada com o deputado federal e governador de Alagoas Manoel José Duarte, Virgílio Alves de Carvalho e José Alves de Carvalho (faleceu em 26 de junho de 1899).
O Comendador Tibúrcio Alves de Carvalho foi um dos fundadores, em Fernão Velho, da Sociedade Anônima Companhia União Mercantil, em 20 de agosto de 1857. Tinha como sócio José Antônio de Mendonça.
Tibúrcio Alves de Carvalho Filho, que foi deputado provincial (1886-87), estadual constituinte (1891/92), federal (1912/14), presidente da Associação Comercial de Maceió e provedor da Santa Casa (1885/87), casou-se em outubro de 1887 com Ismenia de Almeida Guimarães (passou a assinar Ismenia de Almeida Carvalho). Em 1889 tiveram uma filha de nome Noemi, que casou-se com o primo João Lício Marques.
Ismenia nasceu em 15 de dezembro de 1866 e faleceu em 21 de agosto de 1917 no Rio de Janeiro. Era filha de Jose Antonio de Almeida Guimaraes e de Maria Lina Coutinho de Almeida Guimaraes. Eram seus irmãos Américo de Almeida Magalhães e Adolpho Almeida Guimarães.
Com 20 anos de idade, em 21 de janeiro de 1884, Tibúrcio Alves de Carvalho Filho foi incluído por seu pai como sócio na firma Carvalho & Filho, estabelecida em Jaraguá. A outra firma, a Carvalho, Lopes & Cia, que ficava na Rua do Comércio, recebeu em sociedade, também em 1884, dois funcionários: Joaquim Lopes Ferreira Pinto e Antonio Constantino Pereira Diegues.
Em dezembro de 1894, logo após adquirir o Engenho Uruba e transformá-lo na Usina Ismenia, homenageando sua esposa, recebeu do presidente da República, Prudente de Moraes, autorização para, em sociedade com Boaventura Amorim e Pedro de Almeida, organizar a Companhia Centro Comercial em Alagoas (Decreto nº 1.925, de 26 de dezembro de 1894). Essa companhia também exportava a aguardente, o açúcar e o álcool produzidos em sua Usina.
No dia 25 de setembro de 1899, Tibúrcio Alves de Carvalho Filho recebeu na Usina Santa Ismênia várias autoridades e personalidades do mundo do açúcar para a festa de início da moagem daquela safra. Dois vagões do trem expresso da Alagoas Railway saiu de Maceió às 8h com os convidados.
Estiveram presentes Luiz Amorim Leão da Usina Leão (Utinga), dr. Costa Leite, dr. Sylvio Moeda, vigário de Atalaia Padre Pio, dr. José Bezerra (de Pernambuco), senador José Miguel, coronel Ezequiel Pinto, major Souza Leite, Francisco Machado, Theodoro dos Santos, coronel José Miguel de Vasconcellos, dr. Ascânio Pereira, dr. Acácio Pereira, dr. Costa Leite, sr. H. Haynes, Deomedonte Magalhães e outros. O gerente da Usina era o dr. Emiliano de Britto.
O jornalista Euzébio de Andrade, redator chefe do jornal O Gutenberg, publicou no dia 27 de setembro reportagem completa sobre o evento e disse que encontrou naquela usina maquinismo moderno e um espaçoso edifício de alvenaria, com três secções interligadas.
A primeira era o depósito de cana; na segunda ficavam as caldeiras, desfibradores, clarificadores, vácuo, turbinas e respectivas máquinas; e na terceira, que era a maior, havia uma divisão em duas partes: uma ocupada pela grande destilação a vapor Sá Valle e a outra com as dornas de garapa e depósitos de aguardente e álcool. Nas duas casas apensas ao edifício ficavam a tanoaria e a oficina de serralheiro. A chaminé tinha 28 metros de altura.
A conexão com a linha férrea da Alagoas Railway se dava por uma estrada de ferro de 50 cm de bitola. Produzia diariamente 80 sacos de açúcar; 48 pipas de aguardente ou 40 de álcool, se trabalhasse dia e noite. O edifício e a vivenda eram iluminados por luz elétrica.
No final daquele mesmo ano de 1899, o Gutenberg informou em sua edição de 7 de dezembro, que o Estado de Alagoas contava com 34 municípios e 971 engenhos de fabricar açúcar, “além das importantes usinas Wandesmet, Sinimbu, Leão, Santa Ismênia e Wanderley”. Estas usinas tinham equipamentos para destilação e fabricavam em média 6.800 pipas de aguardente e cerca de 1.000 de álcool.
As modernizações operadas na Usina Santa Ismênia continuavam em agosto de 1904 com as importações de equipamentos da Europa, como noticiou o Jornal do Brasil do Rio de janeiro. Em novembro de 1904, a Gazeta de Notícias, também do Rio de Janeiro, informou que o Ministério da Fazenda havia concedido isenção para “18 tubos de cobre destinados a reparos de maquinismos da Usina Santa Ismênia em Alagoas”.
Em 1905, quando teve início a moagem em 18 de setembro, a Usina Santa Ismenia tinha sido totalmente reformada.
Usina Uruba
A partir de 1914, alguns jornais passaram a citar a Usina Uruba e não mais Usina Santa Ismênia, indicando que alguma mudança acontecera por lá. Tinha sido adquirida pela firma Pedro Cansanção & Filhos, liderada pelo coronel Pedro Cansanção, que adotou a denominação do antigo engenho. No início da década de 1920, a família Cansanção havia constituído a Companhia Açucareira Alagoana.
O bacharel Pedro da Cunha Bezerra Cansanção nasceu em 25 de julho de 1857 e faleceu em 10 de setembro de 1933. Era filho de Aristides Arnaldo Bezerra Cansanção (1827 – 1887) e de Josepha Hermelina Carneiro Albuquerque Cansanção (1823 – 1895).
No dia 11 de outubro de 1922 explodiu uma de suas caldeiras e quatro feridos foram transportados para a Santa Casa em Maceió. Ainda no dia 11 faleceram Pedro Gomes, José Tertuliano e Francisco Valentim. Encontrava-se em estado grave Hildebrando Paulino de Oliveira.
Pedro Cansanção teve oito irmãos. Casou-se com Antônia Casado da Cunha Lima (1871-????) e tiveram 10 filhos. Vinha de uma família com larga experiência nesse ramo da agroindústria. Era bisneto da lendária Ana Lins, dona do Engenho Sinimbu em São Miguel dos Campos.
Em 1907 era proprietário dos engenhos Alegria e São Bernardo. O engenho Alegria veio a ser a Usina Alegria, em Murici, onde também fundou a Usina Mucury em 1926. Moeu somente a partir da safra 1929/30.
No censo dos estabelecimentos rurais de 1920, aparece como proprietário em Atalaia das fazendas Uruba, Urupema e Gravatá.
Manoel Sebastião de Araújo Pedrosa
Em 1925, a Usina Uruba trocou de dono novamente. Quem adquiriu a Companhia Açucareira Alagoana foi Manoel Sebastião de Araújo Pedrosa (1889-1936) e seus irmãos, Antônio Leonardo e Maria Alice.
Essa família paraibana vinha do município de Santa Rita, onde foram proprietários do Engenho Velho, depois Usina Pedrosa. A mãe deles, Maria Margarida Kuhn Pedrosa, que era viúva desde 1906, veio junto. Manoel Sebastião era casado com Olga Dias Cardoso, seu irmão Antônio Leonardo com Amélia Calmon e Maria Alice com José Elpídio Gondim.
Segundo o reconhecido escritor e historiador Gustavo Maia Gomes, seu avô, Manoel Sebastião de Araújo Pedrosa, avaliou que a usina era de grande porte para os padrões da época e cheia de problemas, com o maquinário em péssimas condições. Entretanto, como o preço era convidativo, pagou por ela.
Heloisa Pedrosa Resende, filha de Manoel Sebastião, conta que a usina tinha fama de ter uma caveira de burro enterrada, o que levou todos os seus donos anteriores ao fracasso. Isso não ocorreu com a nova gestão. Ela recorda que o começo foi atribulado, mas logo a Uruba entrou nos eixos e passou a oferecer expressivos lucros para seus proprietários.
Foi beneficiada também pelo excelente preço alcançado pelo açúcar naquele período, permitindo a substituição do antigo maquinário e a aquisição de terras para o cultivo da própria cana.
Os bons resultados levaram a família a iniciar a construção de nova vivenda. Ainda segundo Gustavo Maia Gomes, foi a sua avó Olga que encontrou uma planta em uma das publicações europeias de decoração e arquitetura. A casa ainda existe.
Lamentavelmente, Manoel Sebastião não viveu o suficiente para usufruir da nova moradia. Adoeceu e foi internado em Maceió no dia 19 de março de 1936 com grave quadro infeccioso. Era diabético e como ainda não havia antibióticos, faleceu no final da tarde de 4 de abril de 1936.
A Usina, que tinha sido deixada para os irmãos Antonio Leonardo — morava no Rio de Janeiro — e Maria Alice, aos poucos foi sendo adquirida por José Elpídio Gondim, marido de Maria Alice.
Gustavo Maia Gomes descreve essa sucessão revelando que deixou sequelas na família: “Minha mãe e sua irmã Heloisa guardaram profundas mágoas dos Gondim — o principal deles, José Elpídio, era casado com Maria Alice, irmã de Manoel Sebastião —, que teriam usurpado a usina, após a morte deste. Não posso garantir que estavam certas nessa avaliação. De qualquer forma, talvez pela ação da justiça divina, os supostos usurpadores pagaram um preço alto pelo que possam ter feito.
Outro episódio que colocou a Usina Uruba nos noticiários dos jornais ocorreu em outubro de 1936. Raul Dias Cardoso (1894-1979), irmão de Olga Cardoso Pedrosa, cultivava fumo em Capela, município vizinho a Atalaia, e era ardoroso defensor do Integralismo. Esse movimento pretendia chegar ao poder derrubando Getúlio Vargas do governo. Raul Dias foi preso no início de outubro daquele ano e o núcleo da “Ação Integralista” foi fechado.
Grupo João Lyra e a Copervales
No início da década de 1970, a família de Elpidio Gondim e Jarbas Bagdad administravam a Companhia Açucareira Alagoana, tendo como diretor-presidente José Maurício Pedrosa Gondim. Foi sob sua gestão que a Uruba foi vendida, em 1976, ao Grupo João Lyra. Atravessava grave crise financeira.
Nova crise levou a Uruba a fechar em 2013. Voltou a moer em novembro de 2015, quando 111 fornecedores de cana criaram a Cooperativa Agrícola do Vale do Satuba, a Copervales Agroindustrial, que arrendou a Usina e a colocou em funcionamento. Tem como presidente Túlio Maurício Acioly Tenório.
Em 30 março de 2023, o Tribunal de Justiça de Alagoas decidiu que o contrato de arrendamento da Usina Uruba, pertencente à Massa Falida da Laginha Agro Industrial S.A, fosse renovado pelo período de 12 anos.
Que história mais linda,
Agradeço, prezado Ticianeli, mais esta reportagem.
está de parabéns deveria ter mais matérias sobre alagoas
Graças a este grupo de fornecedores da cooperativa agrícola do Vale do Setúbal ” ASPROVALES ” fornecedores de cana de açúcar da família Tenório Raposo, Tenório Aciole e Tenorio Fireman inicialmente e posteriormente com vários outros fornecedores da região foi realizado o arrendamento por um período de 10 anos 2014 a 2024 arendada pela segunda vez por mais 12 anos
Parabéns o grupo que administra a Usina Urina, gerando emprego pra toda região.
Parabéns a todos que o grupo da Empresa ASPROVALES
Parabéns para esse grupo que geri esse empreendimento e não deixa a história dessa empresa se perder no tempo.
Essa história remete a um passado que traça a minha vida. Em 1948 eu nasci na Fazenda Riachão onde morava José Elpidio Gondim, Maria Alice e filhos, onde meu pai era o motorista da família. Trabalhou durante 15 anos que veio a deixar de prestar os serviços para a família do Usineiro para se transferir para a Cidade de Maceió, com o objetivo de poder promover uma escolaridade de melhor qualidade para as minhas duas irmãos mais velhas Alba Bulhões e Alda Bulhões. Meu pai Álvaro Bulhões continuou a sua lida como motorista no segmento de carros de praça (táxi nos dias de hoje), isso aconteceu há 75 anos.
Em 1981 prestei serviços a Usina Uruba como integrante da equipe técnica da DEDINI METALÚRGICA na função de engenheiro mecânico, resolvendo problemas do acionamento das moendas.
Hoje vejo essa Usina renascer nas mãos de profissionais competentes e habilidosos que certamente saberão praticar uma gestão que garantirá a sustentabilidade do parque fabril da COPERVALES (velha URUBA).
Meu pai severino José Rodrigues trabalhou para o sr.Mauricio Gondin acredito por uns 20 anos foi chefe no escritório escritório da usina .Passei parte da minha infância lá .
parabéns pela história de nossa amada e queria Alagoas, Atalaia terra encantadora cheios de histórias que surpreende a todos, uma matéria muito proveitosa
Gostei…
Linda História
Queria muito pode trabalhar nessa grande empresa