Marechal Gabino Besouro, um linha-dura na política alagoana
Gabino Suzano de Araújo Besouro nasceu no dia 22 de junho de 1851 em Penedo, Alagoas. Filho de uma família pobre, mesmo sendo sua mãe da tradicional família Malta.
Ficou órfão ainda criança. Com 14 anos de idade, deixou o trabalho de caixeiro de uma casa comercial em sua terra natal e se apresentou em Maceió, em 25 de agosto de 1866, no 2º Corpo Provisório dos Voluntários da Pátria para combater na Guerra do Paraguai.
No dia 22 de setembro de 1866, o Exército da Tríplice Aliança atacou Fortaleza de Curupaiti. Foi derrotado pelos paraguaios. O jovem Gabino Besouro teve o seu batismo de fogo nesta que foi considerada a maior derrota aliada.
Em meados de 1868 voltou a enfrentar fogo inimigo no Chaco, onde foi promovido a sargento por ato de bravura. O grande feito destes enfrentamentos ocorreu em 25 de julho de 1868, quando o Exército aliado se apossou da Fortaleza de Humaitá.
Em dezembro de 1868, voltou a ter participação reconhecida nas batalhas vitoriosas de Assunção, Lomas Valentinas, Desfiladeiro de Sapucaí e Angustura, a famosa “dezembrada”. Foi ferido em um dos combates, o que lhe rendeu o reconhecimento dos superiores, levando-o a ser condecorado com a “Medalha do Mérito Militar”, por “distinção exibida em três combates”.
Estava entre os que acompanharam o Conde D’Eu — comandou o Exército aliado a partir de 22 de março de 1869 — na perseguição a López, que havia se refugiando na Cordilheira dos Altos.
No final de 1869, quando a guerra já estava no fim, foi promovido a 2º tenente da Artilharia.
Com o fim da Guerra do Paraguai, em 1870, e a consequente desmobilização do Corpo de Voluntários da Pátria, foi desligado do Exército. Voltou a se engajar no dia 20 de abril de 1870 como soldado raso no 1º Regimento de Artilharia a Cavalo, o mesmo em que chegara a oficial nos combates do Paraguai.
Entrou para a Escola Militar em 1871, sendo promovido a 2º tenente de artilharia em 26 de junho daquele mesmo ano, mas passando a ter efetividade em 25 de janeiro de 1873.
Demorou a concluir o curso, sendo expulso com mais 21 outros alunos em 1875, ficando suspenso por dois anos. Voltou a estudar no Rio Grande do Sul. O motivo da expulsão foi o enfrentamento das arbitrariedades cometidas por superiores, principalmente pelo General Polydoro.
Concluiu o curso somente em 1881 e foi promovido, em 19 de novembro daquele ano, a 1º tenente, já graduado como Engenheiro Militar.
Sua rebeldia também lhe causou embaraços em 1882, quando cursava a Escola do Estado Maior e foi impedido de realizar a matrícula pelo ministro da Guerra, Carlos Affonso, que vinha sendo denunciado no jornal Globo por um tal de Argos, pseudônimo de Gabino Besouro.
Essa mobilização de militares republicanos contra a cúpula do Exército foi um dos primeiros movimentos e ponto de partida para várias dissenções que culminaram com o fim da monarquia e a instauração da República.
Militar e ativista republicano
Foi casado com Cassiana Azambuja Besouro, que faleceu no dia 26 de junho de 1914 no Rio de Janeiro. Tiveram uma única filha, Anadia de Azambuja Besouro Cintra, que casou com o advogado Guilherme Tell Coelho Cintra. Do casamento nasceram Lourdes, Gabino, Cilene e Hélio. Destes, Gabino Besouro Cintra, jornalista, advogado e delegado de polícia, ocupou postos de destaques na administração pública brasileira dos anos 30 e 40.
Gabino Besouro era um ativo propagandista dos ideais republicanos, escrevendo em jornais, sempre protegido por pseudônimos e estabelecendo círculos políticos também na sociedade civil.
Na carreira militar, suas promoções foram as seguintes: capitão em 15 de dezembro de 1888, major em 7 de abril de 1892, tenente-coronel em 8 de agosto de 1895, coronel em 2 de agosto de 1905, general de brigada em 14 de novembro de 1910 e, em 1917, general de Divisão. Chegou a Marechal do Exército por força da reforma compulsória, nos primeiros dias de 1918.
Na política
Em 15 de novembro de 1889, data da proclamação da República, era secretário da Escola de Tiro no Rio Grande do Sul.
Meses depois, atendendo ao chamado do ministro da Guerra, Benjamin Constant, foi escolhido para compor a comissão provisória encarregada de elaborar o projeto de reforma da administração militar brasileira, demonstrando que era uma das lideranças dos republicanos.
Participava desta comissão quando foi nomeado, sem consulta prévia, para governar o Piauí. A escolha foi de Floriano Peixoto, um dos homens fortes da República.
Esteve no Piauí por pouco tempo. Tomou posse em 23 de agosto de 1890. Administrou sem aceitar imposições do Governo Federal e nem das forças políticas locais, desagradando a muitos. Deixou o governo em 19 de outubro de 1890.
Representou Alagoas na comissão dos 21 parlamentares encarregados de elaborar o parecer sobre o projeto de Constituição Federal.
O Congresso Nacional Constituinte foi instalado no dia 15 de novembro de 1890 e a primeira Constituição Republicana foi promulgada no dia 24 de fevereiro de 1891.
Em 15 de setembro de 1891, após indicação dos seus amigos em Alagoas, foi eleito deputado federal por seu estado natal, permanecendo no cargo até 1893.
No início do seu mandato, participou dos momentos turbulentos que marcaram o fim do curto período de governo constitucional iniciado em 25 de fevereiro de 1891 e encerrado em 3 de novembro de 1891 com o golpe de estado liderado por Deodoro em resposta ao Congresso, que tentava reduzir os poderes do presidente.
Com a primeira Revolta da Armada, iniciada no dia 23 de novembro de 1891 e liderada pelo almirante Custódio de Melo, Deodoro cedeu às pressões e renunciou, entregando o poder ao vice-presidente, Floriano Peixoto.
Nesse período, alinhado com os florianistas, Gabino Besouro rompeu com Deodoro passando a compor a oposição formada por 97 parlamentares.
Nas eleições ocorridas no dia 20 de fevereiro de 1892, o capitão Gabino Besouro foi eleito governador do Estado de Alagoas, tendo como vice-governador o Barão de Traipu. Tomou posse no dia 24 de março do mesmo ano.
Um dos seus atos, que causou enorme repercussão, foi o de declarar nula a nomeação para Juiz de Direito do bacharel Jacintho d’Assumpção Paes de Mendonça, uma das maiores expressões da economia e da política alagoana de então.
A declaração de nulidade, publicada em 8 de dezembro de 1892, se deu pela exigência da Constituição Estadual de no mínimo cinco anos de prática de foro, no exercício da advocacia, ou de quatro anos na judicatura ou promotoria pública para se habilitar a Juiz de Direito.
No governo, manteve aceso seu ideário republicano, pregando intransigente combate aos monarquistas. Era duro com os adversários e tinha isenção e coragem para abordar questões tabus, a exemplo da posse sobre terras públicas.
Esse assunto veio à tona na sua mensagem de posse, quando cobrou do congresso alagoano pressa “em legislar sobre as terras públicas, hoje pertencentes ao Estado, convindo quanto antes extremar-se o domínio público do particular e verificar-se a legitimidade das posses”.
Explicou que o tema estava ligado ao da colonização, “base de nosso desenvolvimento agrícola e da exploração das nossas riquezas naturais e que está a exigir as cogitações do Congresso”. Alertava ainda para a devastação das matas alagoanas e para a necessidade de “coibir essa ilimitada destruição”.
Em 24 de março de 1892, quando o presidente do Senado alagoano, Barão de Traipu, passou o governo para o capitão Gabino Besouro, relatou que de fato “muitos desses terrenos estão indevidamente ocupados, pelo que é mister liquidar oportunamente essas posses e outras ilegitimáveis que, segundo consta, se acham ocupadas por intrusos que nelas estabeleceram cultura e morada”.
Entretanto, em 1893, na mensagem ao Congresso de 15 de abril, admite dificuldades em prosseguir com suas intenções: “Cheguei a dar os primeiros passos para a execução da lei que autorizou o Governo a decretar os códigos rural e florestal do Estado; mas a complexidade do assunto, completamente novo entre nós, a dificuldade de adaptação do que existe em outros países, a necessidade de bem estudar o problema e resolver pela perfeita apreciação dos nossos costumes, índole, natureza e origem das propriedades territoriais, etc., tudo isso concorre para que só mais tarde possamos ter esses dois corpos de leis”.
Segundo o historiador Moreno Brandão, foi durante o seu governo, no dia 14 de janeiro de 1894, que ocorreu o conflito em Jaraguá entre soldados do Batalhão de Segurança e os matriculados na Capitania do Porto, resultando em muitas mortes e ferimentos. Brandão classificou o episódio como uma ação de provocadores da oposição. Os governadores, nesta época, tinham pouco ou nenhum controle sobre a polícia.
Em 1894, com a ampliação e fortalecimento do campo oposicionista, que ganhou o apoio do presidente Floriano Peixoto. Esteve envolvido com a Segunda Revolta da Armada Nacional, que foi sufocada em 13 de março daquele ano.
Segundo alguns historiadores, Gabino Besouro se considerava um florianista, mas os fuxicos e intrigas terminaram por afastá-lo de Floriano e de seu vice-governador, o Barão de Traipu. O presidente de República, também alagoano, resolveu enfraquecê-lo e passou a hostilizá-lo, apoiando ostensivamente seus adversários.
O texto do historiador Félix Lima Júnior, O buraco do Besouro, ajuda a esclarecer o clima político em Alagoas naqueles anos: “Seu governo foi dos mais atribulados. Inimigos políticos e pessoais criaram toda sorte de dificuldades ao bravo soldado e foram além: desrespeitaram sua digna e Exma. consorte. Ciente de que eles estavam preparando um movimento armado para a sua deposição, Besouro tratou de organizar a resistência no Palácio do Governo, o antigo, na rua Barão de Anadia, […]. Aumentou o efetivo do Corpo de Segurança sempre conservado em meia prontidão, bem armado e melhor municiado”.
“Seus adversários recorreram, honestos e desonestos, a processos sujos e sórdidos, para atrapalhar a administração progressista e de larga visão, que tanto beneficiou o Estado. Conseguiram desertasse grande número de soldados do Corpo de Segurança, sendo os mesmos imediatamente incluídos no 26° Batalhão de Infantaria do Exército, aqui organizado nos últimos meses do regime monárquico”, explica Félix Lima Júnior.
No início de junho de 1894, o governo dava mostras que não controlava a situação e as ruas foram tomas por vários atos de desordem envolvendo soldados da milícia estadual e do 26° BI sob o comando do tenente Honorino de Almeida.
Depois do ambiente de terror criado em Maceió por vários dias, na madrugada de 16 de julho de 1894, o Palácio foi cercado por soldados do Exército. Com a guarda do governo abandonando seus postos, Gabino Besouro teve que fugir utilizando um buraco aberto no muro dos fundos da sede do governo, para dar acesso a ele e a sua família à residência do amigo, tenente-coronel Emídio Dantas Barreto, que ficava na Praça D. Pedro II.
Antes de abandonar o governo, Gabino Besouro passou o cargo para o coronel da Guarda Nacional, Macário das Chagas Rocha Lessa, presidente da Câmara dos Deputados. Sua deposição foi oficializada pelo Supremo Tribunal Federal como sendo o fim do seu mandato.
Fora da política, voltou à vida militar e no ano de 1897 assumiu o comando da Escola Prática do Exército, em Rio Pardo, no Rio Grande do Sul, permanecendo lá até 1898. No ano seguinte foi chefe de gabinete da Direção Geral de Engenharia, no Rio de Janeiro.
Em janeiro de 1904 era o Chefe de Pessoal da Escola Militar do Brasil no Rio de Janeiro, cargo que ocupou até agosto daquele ano. Nesse período também presidia a Cooperativa Militar do Brasil.
Tentou voltar à política em 1906 e candidatou-se ao governo de Alagoas enfrentando Euclides Malta. Foi derrotado por larga margem de votos. Obteve somente 1.749, enquanto Euclides Malta conseguiu 14.511 sufrágios.
Neste mesmo ano, ainda como tenente-coronel, foi secretário do ministro da Guerra, marechal Bernardo Vasques.
Voltou a participar da política dois anos depois, quando assumiu a prefeitura do Departamento do Alto Acre em 18 de janeiro de 1908, lá permanecendo até 14 de novembro de 1909. Entretanto, seu ato de destituição foi assinado somente em 31 de março de 1910.
A sede do Departamento ficava na então Vila Rio Branco, na margem direita do Rio Acre e sua condição de capital vinha sendo questionada, havendo várias tentativas de mudança da sede departamental.
Gabino Besouro, em 1909, tentou resolver o problema ao seu modo e desapropriou uma parte das terras do Seringal Empresa, situado à margem esquerda do Rio Acre e situada em frente à Rio Branco.
Definiu um novo arruamento para Rio Branco, começando na margem do rio, e nas terras altas da margem esquerda fundou Penapólis, uma nova cidade em homenagem ao presidente Afonso Pena, e a definiu como a nova sede da Prefeitura Departamental do Alto Acre.
Entretanto, as atividades econômicas e sociais de Rio Branco terminaram por se imporem e em pouco tempo houve a unificação em uma só cidade. Penápolis passou a ser mais um bairro da capital Rio Branco.
De volta ao Rio de Janeiro, assumiu o cargo de comandante da Escola de Estado Maior em 3 de outubro de 1910. Foi nomeado em 29 de setembro.
Após ser promovido a general de brigada em dezembro, foi nomeado para a presidência do Conselho de Guerra.
Em janeiro de 1911, substituiu o general José Alípio da Fontoura Costallat na presidência da Comissão de Promoções do Exército, continuando como comandante da Escola de Estado Maior na Praia Vermelha. Assumiu o comando da 12ª Região Militar em julho de 1914.
Foi para o Rio Grande do Sul em 1915 como comandante da 7ª Região Militar. Em fevereiro de 1916 foi transferido para o comando da 5ª Região no Rio de Janeiro, onde permaneceu até ser exonerado a pedido em 1º de dezembro deste mesmo ano. Ficou lotado como adido no Departamento de Guerra. Nesse período também comandou a 3ª Divisão do Exército.
No início de janeiro de 1918, foi reformado compulsoriamente como Marechal do Exército, após a aprovação no Senado da redução do tempo de serviço dos militares.
Em março de 1918, filiado ao Partido Conservador, disputou o governo de Alagoas contra Fernandes Lima. O resultado foi divulgado no dia 12 de junho. Venceu Fernandes Lima, mas teve a legitimidade da vitória questionada.
Para se ter uma ideia do clima político em Alagoas, ao final das eleições o jornal Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro noticiou que após o anúncio do resultado o governador eleito tomou “todas as necessárias precauções para sua posse, trazendo dos sertões homens valentes, que formarão a sua guarda pretoriana”.
O jornal informou ainda que “A polícia, usando de uma cautela digna de todos os elogios, resolveu, para não ensanguentar o solo alagoano, desertar em massa, evitando assim uma luta cujas consequências talvez fossem terríveis, se ambos os contendores não resolvessem fugir do barulho”.
Foi uma campanha marcada pela violência desde o início.
Quando Gabino Besouro desembarcou na capital, em 9 de outubro de 1917, para iniciar sua campanha, o cortejo que o levou do porto de Jaraguá para o Centro de Maceió foi interrompido na Rua do Comércio por apoiadores de Fernandes Lima.
Houve um sério conflito e a polícia interveio atirando nos contendores. Um dos feridos a bala, Lauriano Oiticica, faleceu dias depois. Era cunhado do deputado estadual Ângelo Martins.
Após esta derrota, Gabino Besouro voltou a morar no Rio de Janeiro e seu nome somente reapareceu nos jornais como um dos membros do Circulo dos Oficiais Reformados do Exército e da Armada.
Faleceu na madrugada de 21 de janeiro de 1930, em Copacabana, no Rio de Janeiro. Viveu seus últimos momentos praticando o vegetarianismo.
Ainda em vida foi homenageado, em 1914, no município de Viçosa, Alagoas, com o Tiro de Guerra nº 206 recebendo seu nome.
O governador Costa Rego também prestou tributo a Gabino Besouro em 1926, dando o seu nome a uma draga adquirida para desobstruir os canais da lagoa Mundaú.
Em 1º de março de 1930, o prefeito de Rio Branco no Acre mudou a denominação da Rua Alagoas para Rua Gabino Besouro e o saudou como fundador da cidade de Rio Branco.
Em Alagoas, seu nome ainda é lembrado na Escola Estadual Gabino Besouro em Penedo, na Praça Gabino Besouro em Arapiraca, na Rua Gabino Besouro em Palmeira dos Índios e de outra em Maceió, ao lado do Quartel Geral da Polícia Militar. Ainda na capital, tem a Avenida e Travessa Gabino Besouro no Conjunto Cidade Universitária.
Excelente contribuição Ticianeli . Na minha cidade, a querida Palmeira dos Índios, tem a Rua Gabino Besouro. Sucesso.
Incorporamos ao texto a sua informação. Grato.
Em outubro de 1950, na cidade de Mata Grande-AL, por questões políticas vários membros de uma mesma família foram assassinados, começando pelo chefe Eustáquio Malta (a revista O Cruzeiro noticiou). A ocorrência se deu na rua GABINO BESOURO que tempo depois passou a se denominar rua UBALDO MALTA como homenagem ao adolescente morto naquela ocasião.
Excelente contribuição para a história, inclusive para nós piauienses que poucas informações temos do General Gabino Besouro que, embora por pouco tempo, governou o estado do Piauí.