Hildebrando Falcão e a intentona comunista de 1935 em Alagoas

Hildebrando Falcão, de óculos na área central da foto, entre os deputados após cerimônia de instalação da constituinte em Alagoas no dia 26 de maio de 1935

O levante insurrecional organizado pela Aliança Libertadora Nacional (ALN) iniciada no dia 23 de novembro de 1935 com a participação ativa do Partido Comunista do Brasil, PCB, não teve ações em Alagoas, se mostrando “uma conspiração de altíssimo risco e baixíssima capacidade operacional”, como avalia Luiz Sávio de Almeida em seu artigo Um pequeno bilhete sobre a “Intentona Comunista” em Alagoas ou um novembro avermelhado.

O primeiro tenente Mário de Carvalho Lima foi o escrivão do inquérito militar de 1935

Como escrivão do inquérito que apurou a mobilização dos insurretos em Alagoas, o então 1º tenente Mário de Carvalho Lima, que chegou a general, deixou escritos revelando detalhes do episódio. Segundo seu texto, no dia 20 de novembro os oficiais foram convocados para uma reunião no Gabinete de Comando, onde foram informados sigilosamente que “se tramava um movimento comunista no Batalhão”, articulado nacionalmente pela Aliança Nacional Libertadora sob a direção do capitão Luiz Carlos Prestes.

Na explanação aos oficias foi informado que o líder do movimento no 20º BC era o 3º sargento Josué Augusto de Miranda e que havia indícios da participação do 2º tenente contador Luiz Xavier de Souza e do sargento-ajudante João Marçal de Oliveira, além da cumplicidade dos cabos Oséas Pimentel de Almeida, José Maria Cavalcanti, Nildo Pereira de Lucena e Vicente Ribeiro Cavalcante.

Na tarde daquele mesmo dia houve uma reunião dos insurgentes na Praia do Sobral, atrás do Quartel. Sob o disfarce de um simples jogo de futebol, aconteceu o contato com o capitão Otacílio, que era o chefe do movimento no 29º BC, no bairro Socorro em Recife. Um espião do comando militar alagoano acompanhou tudo.

Como aconteceria no dia seguinte uma missa na Catedral Metropolitana de Maceió em memória do capitão Aguinaldo Valente de Menezes, falecido uma semana antes, toda a tropa foi convocada. Na volta ao Quartel, foi ordenada a formatura geral e os implicados foram presos.

José Maria Cavalcanti em 1945

Assim, no dia 21 de novembro, dois dias antes da conflagração evolucionária em Natal, Rio Grande do Norte, o comandante do 20° Batalhão de Caçadores, major José de Andrade Faria, baixou portaria determinando a abertura de inquérito, sob a sua presidência, para punir os militares envolvidos na preparação daquele movimento em Alagoas.

Mário Lima deixou registrado que a notícia do levante em Natal, no sábado 23 de novembro, levou o 20º BC a entrar em regime de rigorosa prontidão. O soldado telegrafista Jeferson, que por acaso estava na Estação PTR-2 do 20º BC, ouviu uma chamada e estabeleceu o seguinte diálogo com o operador da estação-rádio do 21º BC em Natal:

Maceió – Alô, alô, Natal. Aqui Maceió, o que é que há?
Natal – O 21º BC levantou-se agora mesmo. Aguente a mão, tenho mensagem urgente para Recife.
Maceió – Como é, companheiro?
Natal – As coisas aqui estão pretas. É bala para desgraça.
Maceió – Que movimento é esse?
Natal – É um movimento comunista de sargentos, cabos, soldados e operários. Adeus; por ordem superior estão cortadas as comunicações.

Segundo Mário Lima, foi da estação de Maceió que o Brasil foi informado do levante em Natal.

Sobre a atuação do então deputado estadual Hildebrando Falcão, Mário Lima o identificou como líder civil da intentona e revelou “as cartas conspiratórias” trocadas por ele com um “dos seus chefes no Rio de Janeiro” —   —, citando trechos, entre eles um em que o parlamentar constituinte diz: “Convém salientar nossa perfeita identidade com os elementos de esquerda”. Outros destaques nos escritos são as notícias sobre o combate ao integralismo por parte da Aliança Nacional Libertadora em Alagoas.

No inquérito também surgiram os nomes dos civis Sebastião da Hora, Esdras Gueiros, Manoel Leal e do capitão Alves Mata, da Polícia Militar.

Sávio Almeida informa que o inquérito demorou um pouco mais que um mês e gerou um volume manuscrito intitulado “Inquérito policial-militar sobre a conspiração de um movimento subversivo no 20º BC”, datado de 24 de dezembro de 1935.

Somente no início de janeiro de 1936, quando vários indivíduos já estavam presos, foi que o juiz federal Alpheu Rosa Martins despachou a denúncia e o pedido de prisão preventiva que havia sido solicitado pelo procurador interino da República Armando Goulart Wucherer.

General Newton de Andrade Cavalcanti nasceu em Palmeira dos Índios e em 28 de novembro de 1935 foi promovido ao posto de General de Brigada

Foram mantidos presos na penitenciária de Maceió os seguintes indiciados: Josué Augusto de Miranda, Oséas Pimentel de Almeida, José Maria Cavalcanti, Nildo Pereira de Lucena e Vicente Ribeiro Cavalcanti.

O despacho solicitava ainda a prisão do cirurgião dentista Esdras Gueiros, capitão Francisco Alves Matta — que mais tarde estará na prisão com Graciliano Ramos —, tenente Luiz Xavier de Souza, sargento João Marçal de Oliveira e sargento Manoel Leal. Também foi solicitada a prisão do deputado Hidelbrando Falcão, condicionada a autorização do Poder Legislativo, fato que ocorreu na sessão do dia 9 de janeiro. O juiz denegou o pedido de prisão para Sebastião da Hora e para o cabo Oscar Leite de Araújo.

No dia 15 de fevereiro de 1936, o procurador da República opinou pela absolvição do capitão Francisco Alves Matta, cabo Oscar Leite de Araújo, Manoel Leal e Sebastião da Hora, e pela condenação dos outros indiciados, todos incursos da Lei de Segurança Nacional. No parecer, há referência a Moura Carneiro, “considerado perigoso comunista, residente no Rio”.

A sessão de julgamento ocorreu no dia 26 de fevereiro e os implicados foram defendidos pelos advogados Antônio Leite e Milton Ramires. Dois dias depois, o Juiz Federal em Alagoas, Alpheu Rosas, absolveu todos com o argumento de que não ficaram provadas as acusações apresentadas pelo Procurador Criminal da República no Estado, e ordenou que fossem libertados imediatamente.

Os militares não gostaram da absolvição e o então comandante do 20º BC, major Orlando de Verney Campelo, comunicou ao comandante da 7ª Região Militar, general Newton Cavalcanti, o ocorrido em Maceió. No dia seguinte, o general desembarcou na capital alagoana de um avião da FAB sem avisar a ninguém, reuniu a tropa no Quartel do 20º BC e deitou falação contra o juiz federal, que foi chamado de incapaz. Informou ainda que se ele não tivesse fugido estaria preso.

Graciliano Ramos também foi preso em 1935

Mário Lima revela que houve um entendimento com o governador Osman Loureiro e com o Chefe de Polícia, e “o general ordenou que fossem novamente presos todos os indiciados do IPM e demais pessoas ligadas ao fato”. No dia seguinte, segundo a Gazeta de Alagoas, foram efetuadas cerca de 80 prisões.

Entre os presos, quatro foram levados para Recife e de lá transferidos para outros presídios: Sebastião da Hora, Graciliano Ramos, capitão Alves Mata e o jornalista Humberto Bastos. Segundo Mário Lima, “o esperto Hildebrando Falcão conseguiu fugir de avião”. Os jornais da época noticiaram que o deputado fugiu para Penedo e de lá tomou um avião para o Rio de Janeiro.

No dia 9 de abril de 1936, mais uma leva de oficiais foi afastada do Exército. Entre eles está o 1º tenente Luiz Xavier de Souza, envolvido no processo de Alagoas. Vai ser inocentado em janeiro de 1937.

Julgamento no Supremo

O julgamento no Supremo Tribunal Militar dos envolvidos “nos sucessos extremistas” em Alagoas, relatado pelo ministro Bulcão Vianna e tendo como revisor o ministro Edmundo da Veiga, começou no dia 29 de janeiro de 1937. Em pauta o recurso da Procuradoria Criminal da República em Alagoas, que insistia na punição.

Hildebrando Falcão fez a defesa e o procurador geral de Justiça Militar, Washington Vaz de Mello insistiu no pedido de condenação, considerando justa a apelação formulada pelo seu colega em Alagoas.

A conclusão dos ministros foi divulgada no dia 30 de janeiro com o seguinte resultado: o ex-sargento Josué Augusto de Miranda e o ex-cabo Oséas Pimentel de Almeida foram condenados a seis anos e oito meses de prisão, apontados como os cabeças do movimento em Alagoas. Os ex-cabos José Maria Cavalcanti, Nildo Pereira de Lucena e Vicente Ribeiro Cavalcanti foram apenados com cinco anos e quatro meses de prisão. Os demais foram absolvidos.

Em seu estudo, Sávio Almeida coloca sob suspeita o inquérito ao afirmar que não era “fácil entender os nomes constantes da relação militar e difícil entender os nomes de Alves Matta e dos demais civis”.

Almeida teve acesso aos originais das memórias de Matta e constatou que “nada fala capaz de esclarecer o motivo real de sua presença no inquérito. Qual a razão dos demais? Seria interessante esclarecer, mas, sem dúvida, estariam em realce o tom da militância e a evidência pública, especialmente no que se refere a Hildebrando Falcão, Leal, Hora, Esdras Gueiros. Matta é apontado por uma testemunha, José Vieira Lessa, cabo, como chefe subversivo de inúmeros elementos na polícia”.

Esdras Gueiros, que era da cúpula da Aliança, passou a ser um grande articulador por realizar reuniões em sua residência. Sebastião da Hora e Hildebrando Falcão estão no inquérito por causa de um mero depoimento.

Deputado Lourival de Mello Motta analisou as priões como parte do choque político

Esdras da Silva Gueiros veio a ser ministro do Tribunal Superior Eleitoral e do Tribunal Federal de Recursos, indicado pelo general Castelo Branco. Em 1935 era dentista em Maceió — formado pela Faculdade de Farmácia e Odontologia do Recife em 1924 —, mas já cursava Direito na Faculdade de Recife, onde conquistou o bacharelado em 1938. Destacou-se como advogado e foi eleito deputado estadual em Pernambuco por vários mandatos. Era natural de Natal, Rio Grande do Norte.

Lourival de Mello Motta, também deputado em 1935, interpretou as prisões em Alagoas como parte dos choques políticos entre o grupo de Silvestre Péricles com o do governador Osman Loureiro, eleito indiretamente meses antes e líder das oligarquias derrotadas que se rearticularam no poder getulista.

Em discurso pronunciado na Assembleia no dia 9 de setembro de 1948, transcrito no seu livro “Retrato de uma Época”, Mello Mota afirma que as prisões comandadas pelo general Newton Cavalcanti foram uma demonstração de força e desrespeito à lei. “Determinou Sua Excelência a prisão de muitos cidadãos apontados por ele como envolvidos na intentona comunista, com fundamento numa lista de nomes encontrada em poder de inferiores do 20º BC, a mesma lista organizada por ocasião dos preparativos de deposição do Sr. Osman Loureiro. Todos foram presos, civis e militares, inclusive o atual major Alves Mata, excluído da Força Policial, sob a alegação de atividades comunistas, pelo simples fato de ter sido apontado como oficial de confiança do Sr. Silvestre Péricles”.

Muitos dos envolvidos na tal Intentona eram os mesmo que em março de 1935 estavam mobilizados para, se necessário, um levante armado em defesa de Silvestre Péricles. Mello Motta explicou que foi o próprio Silvestre quem divulgou a possibilidade das tropas do Exército saírem as ruas caso ele fosse derrotado. Candidato ao governo no colégio eleitoral formado pelos deputados constituintes, Silvestre “era, naquela época, Auditor de Guerra, com honras de tenente coronel do Exército e desfrutava de larga simpatia entre os inferiores do 20º BC, e entre alguns oficiais”.

O médico Sebastião da Hora também foi detido em 1935

Como logo após as prisões de novembro de 1935, Silvestre, que nada fez ou falou em defesa dos seus seguidores, foi duramente criticado pelo médico e deputado Mello Motta, “porque indiferente, porque egoísta, porque medroso de ser apontado como protetor de comunistas que ele conscientemente sabia não o serem os seus correligionários”.

Outro componente político desse processo envolveu a cassação do mandato do deputado Hildebrando Falcão, que estava preso no Rio de Janeiro e, consequentemente, impedido de comparecer às sessões. Ausente por mais de 30 dias, o deputado solicitou licença médica argumentando que estava enfermo em Campos, Rio de Janeiro. A Assembleia, que já havia autorizado a sua prisão, não aceitou o pedido e passou a tratar a ausência como renúncia.

Somente votaram pela aceitação da licença os deputados Joaquim Leão e Gustavo Paiva.

No dia 26 de junho de 1936, o poder legislativo estadual comunicou ao Tribunal Eleitoral a perda do mandato de Hildebrando Falcão e no final de setembro do mesmo ano elegeu Guedes de Miranda para sua vaga.

Em sua defesa, o deputado cassado impetrou mandato de segurança junto ao Tribunal Regional Eleitoral, que não tomou conhecimento da solicitação sob o argumento que era matéria política, fora da sua competência. Hildebrando apresentou recurso ao Tribunal Superior, que foi julgado em seu favor entre os dias 6 e 8 de janeiro de 1937, decisão que lhe devolveu o mandato.

Estranhamente, mesmo julgados inocentes, alguns oficias permaneceram presos. Essa situação foi denunciada na Câmara Federal como desrespeitosa as decisões do Tribunal Superior. No dia 13 de outubro de 1937, o Tribunal de Segurança Nacional, por unanimidade, deferiu o pedido de arquivamento do processo nº 79, em que os acusados eram Luiz Xavier de Souza e outros.

Hildebrando Falcão

Quem é esse cidadão alagoano que conjurava ativamente para deflagrar um levante comunista em Alagoas, como consta nas acusações do inquérito, onde é destacado como o aliciador da oficialidade e como um atuante membro da Aliança Nacional Libertadora.

Hildebrando Martins Falcão nasceu em Igreja Nova, Alagoas, no dia 25 de outubro de 1904. Era filho do Coronel Pedro Falcão e de Anna Martins Falcão, que faleceu quando Hildebrando tinha somente um ano de vida.

Estudou no Colégio Diocesano de Maceió e na Faculdade de Direito de Salvador, mas somente concluiu o bacharelado no Rio de Janeiro.

Com Alice Rodrigues Falcão teve um romance, surgindo o relacionamento que o credenciou a criar os dois filhos de Alice: Beatriz Calazans Gomes e Hélio. Posteriormente casou-se com Iracema Besiuchet, com quem teve um filho, Luis Carlos.

Viúvo de Iracema, voltou a casar. Desta feita com Enid Peixoto Braga, miss Alagoas em 1936. Deste casamento teve uma filha, Ana Amélia Peixoto Braga.

Hildebrando Falcão em 1931

Iniciou no jornalismo quando ainda era estudante e colaborava com o Diário da Bahia e, no Rio de Janeiro, com A Esquerda e A Batalha. Fundou O Tempo, que deixou de circular em 1930.

A Esquerda foi um jornal diário fundado pelo alagoano de Viçosa, Pedro Mota Lima, em 6 de julho de 1927 e extinto em agosto de 1933. Embora não fosse um porta-voz oficial do Partido Comunista do Brasil (PCB), expressava seus princípios.

Era um jornal nacionalista, preocupado principalmente com a defesa do operariado. Ao longo do ano de 1928, este diário publicou amplo noticiário sobre os movimentos grevistas nacionais e internacionais e criticou o governo do presidente Washington Luís por recusar a anistia aos integrantes da Coluna Prestes.

Militante da Aliança Liberal, Hildebrando destacou-se ao escrever na imprensa oposicionista e participar dos comícios de forma aguerrida.

No dia 23 de agosto de 1929, o jornal paulista Diário Nacional, ligado ao Partido Democrático, publicou uma nota sobre a propaganda da candidatura liberal no Norte, informando que no domingo, 17 de agosto, “o jornalista Hildebrando Falcão levou a efeito aqui um comício em prol da candidatura Getúlio Vargas à presidência da República”. Segundo a notícia, o orador foi muito aplaudido e recebeu telegramas do próprio Getúlio Vargas e de Antônio Carlos agradecendo ao seu empenho.

Na sede do jornal A Esquerda, em setembro de 1929, apenas um mês após a criação da Aliança Liberal, ocorreu uma reunião para a formação de uma frente única entre os liberais em Alagoas. O encontro foi presidido pelo coronel Felisdoro Gaia e secretariado por Pedro Nelson de Almeida.

Entre os oradores estavam o jornalista Pedro Motta Lima e o acadêmico Hildebrando Falcão. O intuito da reunião era unir a oposição alagoana em torno da Aliança Liberal e definir o apoio à candidatura de deputado federal do jornalista Pedro Motta Lima.

Jornalista Pedro Mota Lima

Ainda no dia 7 de setembro, Hildebrando participou de um comício no Rio de Janeiro representando os liberais de Alagoas e foi muito aplaudido ao afirmar que os nordestinos, embora dominados pelas verminoses e pelas secas, não se deixaram ainda abater e emprestarão valioso concurso à causa liberal.

Após vária prisões no Rio de Janeiro, Hidelbrando Falcão foi transferido para Alagoas, onde assumiu a direção da campanha da Aliança Liberal no sul do Estado, como informa o jornal carioca A Manhã de 18 de outubro de 1929.

Sua primeira tarefa em sua terra natal era colocar em funcionamento o jornal A Semana em Penedo.

Ameaçado por lideranças políticas locais, em entrevista Hildebrando mandou um aviso para os adversários: “Que os ‘mandões’ de Alagoas não se iludam. A minha desmoralização não será barata”. Menos de um mês depois, Hildebrando Falcão já estava preso em Penedo.

Em entrevista ao jornal paulista Diário Nacional de 13 de novembro de 1929, o jornalista explicou que foi a Penedo assumir a direção do jornal A Semana para fazê-lo circular diariamente, e que a empresa adquiriu no Rio de Janeiro equipamentos ao custo de 15.000$000.

Segundo o entrevistado, antes do desembarque destes equipamentos em Penedo, “agentes do governo estadual desviaram a rota das embarcações que conduziam as cargas, e fazendo-as atracar em uma ilha, aí substituíram as peças constantes das faturas e dos manifestos, por pedras e ferros velhos”.

Revoltado, Hildebrando requisitou vistoria ao juiz estadual. Diante da negativa da autoridade, mobilizou jornalistas e outros convidados para testemunharem a troca da mercadoria. O tenente Antônio Pantaleão, que era o delegado de Polícia e comandante da Força Policial da cidade, não gostou da mobilização e prendeu o jornalista adversário do governo.

“Quando saí do cárcere, fui notificado de que deveria deixar a cidade no prazo de 24 horas. Estava expulso. Resignei-me e vim para o Rio de Janeiro”, esclareceu Hildebrando e afirmou que solicitaria ao Tribunal Federal um habeas corpus.

Hildebrando Falcão em 1946

A Aliança Liberal enviou telegrama ao governador do Estado de Alagoas protestando pela prisão do jornalista. Simões Lopes, que assinou a correspondência, disse que chegou a acreditar no sr. Álvaro Paes, mas diante da prova em contrário feita pelo deputado Freitas Melro, lamentava a falta de cultura política e as cenas de selvageria que ainda mais justificam a campanha regeneradora iniciada pela Aliança Liberal. Na mensagem há a menção de que Hildebrando foi “miseravelmente maltratado na prisão”, onde ficou incomunicável.

Após sua expulsão de Penedo e breve passagem pelo Rio de Janeiro, transferiu-se para Minas Gerais, onde foi contratado pelo presidente mineiro, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, como professor da Escola Normal de Rio Branco.

Colaborou com vários jornais mineiros, entre eles o Estado de Minas, e dirigiu O Libertador, no município de Mar de Espanha (MG), como tarefa da campanha aliancista naquele estado.

Mesmo radicado em Minas, Hildebrando continuou a atuar politicamente no Nordeste. Em 1930 foi detido em Recife quando retornava da Paraíba, onde tinha ido proferir uma conferência, no Teatro Santa Rosa, em benefício das viúvas e filhos dos soldados paraibanos que morreram nos combates contra o levante comandado por José Pereira Lima na cidade de Princesa Isabel, naquele estado.

Esse movimento, iniciado em 15 de março de 1930, tinha o objetivo de derrubar o presidente da Paraíba, João Pessoa. O episódio conhecido como a “República de Princesa” só terminou quando as armas de José Pereira e de sua tropa foram entregues ao Exército Brasileiro em 19 de agosto de 1930.

Revolucionário de 30

Com a deflagração do processo revolucionário liderado por Getúlio Vargas, em 3 de outubro de 1930, um dos focos de resistência dos governistas estava localizado em Minas Gerais.

Para o município de Porto Novo do Cunha, na fronteira com o Rio de Janeiro, foi enviado um Destacamento Misto do Rio de Janeiro. Entre os seus comandantes estava o 1º tenente comissionado Hildebrando Falcão, que participou ativamente dos combates entre revolucionários e forças legalistas. Era funcionário do Ministério da Fazenda e sua dispensa do comissionamento se deu no dia 13 de outubro.

No dia 14 de outubro de 1930, a Rua do Comércio em Maceió recebe a Coluna Revolucionária, vindo de Recife

Tudo indica que Hildebrando continuou formalmente investido da autoridade comissionada. Pelo menos é o que revela a notícia publicada no jornal A Batalha de 7 de novembro de 1930. Com foto, a nota diz que o tenente Hildebrando Falcão prendeu no dia anterior (6) em Niterói o ex-deputado Galdino Valle, que durante as lutas revolucionárias organizou diversos batalhões patrióticos e participou de depredações nas fronteiras entre Minas Gerais e Rio de Janeiro.

Teve seu desempenho policial reconhecido e no dia 24 de dezembro de 1930 foi nomeado Inspetor da Guarda Civil em Alagoas.

Enfrentando as Oligarquias

Revolucionário da primeira hora, Hildebrando Falcão foi deslocado para Alagoas onde passou a ter influência em algumas decisões da interventoria de Hermilo de Freitas Melro, nomeado em 14 de novembro de 1930.

Além de ser indicado para a Inspetoria da Guarda Civil, foi um dos articuladores da nomeação do colega jornalista, o pernambucano Estevão Ribeiro, para a Secretaria Estadual de Saúde Pública.

O poder político de Hildebrando não foi exercido por muito tempo.

No final de março de 1931, já tinha sido exonerado da Guarda Civil sob a acusação de ter cometido “graves irregularidades”. No mesmo período, seu colega Estevão Ribeiro também foi afastado da Secretaria de Saúde.

Em entrevista ao jornal Diário da Noite de 22 de maio de 1931, Estevão identificou a retomada do poder em Alagoas pelos derrotados em 1930 ao explicar a sua demissão e a de Hildebrando da Guarda Civil.

Para o jornalista pernambucano, o programa da Revolução em Alagoas continuava sendo mera ficção de visionários. “Alagoas é uma terra infeliz. Governada na Monarquia pela incultura de um barão de Traipu e, mais tarde, sucessivamente, pelos espíritos de governichos improvisados — rara vez chegou a conhecer um homem à frente dos seus destinos. Fernandes Lima, Costa Rego, Álvaro Paes… Dessa trilogia infeliz, porém, eis que que nos surge, pra pasmo dos alagoanos, a figura inexpressiva e dúbia do sr. Freitas Melro. Positivamente, Alagoas tem cabeça de burro”.

Hermilo de Freitas Melro e o governo revolucionário de 1930 em Alagoas

Estevão Ribeiro afirmou que os alagoanos tinham a ilusão que iam se libertar das oligarquias dominantes, mas foram decepcionados.

Denunciou que o interventor, o sergipano Hermilo de Freitas Melro, era um homem sem personalidade e sem vontade própria, subordinado ao interventor de Pernambuco, o usineiro Carlos de Lima Cavalcanti.

Foi o interventor pernambucano quem pediu a cabeça do secretário de Saúde Pública a partir dos seus jornais em Recife. Estevão foi tratado pela imprensa vizinha como inimigo do interventor de Alagoas. Freitas Melro atendeu o pedido e exonerou seu secretário.

Como tentou expor a situação nos jornais de Alagoas sem sucesso, o jornalista demitido resolveu lançar um “boletim” com o seu desagravo. Imediatamente passou a ser ameaçado de morte pelo delegado de Maceió, Manoel Cândido, que tinha sido delegado regional do governo anterior, de Álvaro Paes.

“Ainda mais: para fazer insinuações políticas e ridículas, tentaram envolver o sr. Hildebrando Falcão, como meu conivente na distribuição dos boletins, a fim de afastá-lo da Inspetoria da Guarda Civil”, afirmou Estevão, esclarecendo que “o sr. Hildebrando Falcão é, em Alagoas, a única figura autêntica de revolucionário civil e, ali constituía um entrave sério à marcha dos politiqueiros que envolviam e dominavam o cidadão Freitas”. Para ele, aproveitaram a distribuição dos boletins para tentar “inutilizar a atuação de um bravo soldado da revolução”.

Após o episódio, teve que fugir, passando alguns dias escondido no Engenho São Vicente, até chegar em Penedo e depois Propriá, de onde embarcou para o Rio de Janeiro. “Como vê o meu confrade, vim açoitado pela tirania dos primeiros déspotas da nova República”, concluiu.

Um pouco antes, Hildebrando também já tinha saído de Alagoas e, em meados de abril de 1931, assumiu a chefia de gabinete do prefeito de Niterói, capitão Júlio Limeira. A imprensa local tratava o alagoano como “revolucionário das primeiras horas”. Sua nomeação foi considerada “um ato de justiça”.

Em 1932 era funcionário do Ministério da Fazenda, quando o governo de Getúlio Vargas foi desafiado pela elite paulista. Sempre disposto a lutar, se incorporou novamente e no dia 26 de julho, alistando-se numa brigada militar para combater o movimento contrarrevolucionário de São Paulo. O conflito durou poucos meses, entre julho e outubro daquele ano.

Engajado como 1º tenente comissionado no 4º Batalhão Provisório da Força Militar do Estado do Rio de Janeiro, o jornalista participou dos combates “desde o setor do Túnel da Mantiqueira até as últimas resistências dos rebeldes em Conchal, já no território paulista”, como registrou o jornal O Radical de 8 de outubro de 1932. Entrevistado, enalteceu “as gloriosas tradições do povo fluminense”.

Deputado constituinte

No dia 15 de setembro de 1934, quando Silvestre Péricles deixou o Rio de Janeiro a bordo do vapor “Duque de Caxias” com destino a Maceió, onde chegou às 7h da manhã do dia 21 para iniciar sua campanha para o governo, Hildebrando Falcão era seu companheiro de viajem. Também voltava a Alagoas para candidatar-se a deputado na Constituinte Estadual.

Silvestre Péricles

Silvestre tentava passar a ideia que era o candidato da Revolução e tinha o apoio do seu irmão, general Pedro Aurélio Góes Monteiro, então ministro da Guerra de Getúlio Vargas.

A outra candidatura, de Osman Loureiro, divulgava que teria a maioria do colégio de deputados para sua eleição e pressionava Góes Monteiro por uma definição. O general não gostou da atitude dos deputados, mas deu a entender que não se envolveria em “competições facciosas” e que não prestigiaria “nenhuma candidatura com esse caráter”.

Luiz Nogueira Barros, em seu livro A Solidão dos Espaços Políticos, registra que nesse período veio à tona o debate sobre a Revolução de 30. “Os vencidos de 30, agora tinham uma outra preocupação: eram acusados, publicamente, de desejarem a reversão ao passado, o que equivale dizer que estavam se preparando para um assalto ao poder…”.

Em novembro, o nome do interventor Osman Loureiro foi apresentado como candidato a permanecer no governo, mesmo sem o aval do general Góes Monteiro. O manifesto de apoio recebeu a assinatura de 18 dos futuros deputados, portanto maioria do Colégio Eleitoral, que seria composto por 30 constituintes.

Após o tiroteio de março de 1935, envolvendo Silvestre Péricles e seu irmão Edgard de Góes Monteiro, que havia assumido o comando da Polícia em Alagoas, Silvestre foi para o Rio de Janeiro e voltou no dia 24 de maio. Desembarcou de um hidroavião da Condor em Maceió, novamente tendo ao seu lado Hildebrando Falcão.

Eleito deputado avulso, fato inédito na história das eleições alagoanas, Hildebrando não participou, no dia 27 de maio de 1935, da escolha do governador Osman Loureiro.

Somente no dia 13 de junho de 1935 foi que oficialmente tomou posse como deputado. Da mesma forma que os deputados Arthur de Freitas Melro, Francisco Cavalcanti, Amaryllio Salles e Afrânio Lages, que só foram diplomados no dia 15 do mesmo mês, após julgamento de recursos junto ao Superior Tribunal de Justiça Eleitoral.

Já deputado, em agosto de 1935, mesmo estando em viajem no Rio de Janeiro, Hildebrando enviou telegrama à Assembleia alagoana protestando contra o Governo Federal pela retirada da sonda que prospectava petróleo em Alagoas.

“O triste episódio combatido no seio da assembleia deveria ecoar na praça pública, acordando, nas espoliadas massas trabalhadoras, a ideia cívica da emancipação definitiva dos grilhões dos vorazes imperialistas. Saudações — Deputado Hildebrando Falcão”, conclui o telegrama publicado no jornal A Manhã de 17 de agosto.

Sem filiação partidária, Hidelbrando foi procurado por algumas legendas.

No dia 7 de setembro de 1935, participou no Rio de Janeiro do lançamento do manifesto da Frente Popular pela Liberdade, “um novo partido, que nasce sob a direção de um grupo de intelectuais”, registrou a Gazeta de Notícias do dia 12 de setembro daquele ano.

Hildebrando Falcão em 1955

No dia 20 de outubro teve início no Teatro Deodoro o Congresso Nacional da Juventude, presidido por Hildebrando Falcão. Fazia parte da mobilização contra a guerra e protestava contra a expulsão da jovem comunista romena de 17 anos, Genny Gleizer.

Entre os oradores estavam Sebastião da Hora, André Papini, Hildebrando Falcão e Joaquim Leão. No outro dia a polícia chamou para depor dois estudantes e André Papini.

Hildebrando Falcão denunciou na Assembleia que Papini foi insultado na delegacia. Dois dias depois os jornais do Rio de Janeiro publicaram telegrama do deputado protestando contra a ação da polícia.

Ainda em outubro, registrou na Assembleia Legislativa um pedido de informações dirigido à Polícia para saber os motivos da prisão do operário Júlio Laurindo.

Em entrevista publicada no jornal A Manhã do dia 23 de novembro de 1935, exatamente no dia em que o levante comunista teve início em Natal, Hildebrando afirmava que Alagoas era uma terra dominada pelo cangaceirismo e pela politicagem, vivendo em um regime de opressão de um governo de usineiros, latifundiários e imperialistas contra o movimento libertador.

O deputado denunciou longamente os desmandos do chefe de polícia Ernani Basto, acusando-o de covardemente “prender, espancar e deportar operários, intelectuais e elementos populares que se põem em defesa do povo explorado em seus direitos e que agora se levanta em defesa de suas reivindicações”.

Destacou que a Aliança Nacional Libertadora conquistou a simpatia do povo e que o seu surgimento fez com que o governo redobrasse as suas atividades contra as massas populares. Revelou ainda que o movimento popular repeliu “as tentativas integralistas e que se pôs ao lado do movimento nacional libertador”.

O deputado disse também que organizou em Alagoas a Frente Popular pelas Reivindicações e enumerou algumas delas: “destaca-se em primeiro plano a construção do porto de Maceió, a exploração do petróleo de Riacho Doce e a luta contra o integralismo e pela defesa das liberdades democráticas”. Concluiu dizendo que por estas iniciativas estavam tramando contra sua vida, e por isso se afastou temporariamente de Maceió.

O deputado Motta Lima, no mesmo dia da entrevista, explicou à Assembleia que o motivo da fuga foi uma desavença entre Hildebrando Falcão e o delegado da capital, Mendonça Braga, que o teria ameaçado fisicamente. O deputado havia criticado duramente a cúpula da segurança pública por ameaças contra a sua vida: “Tanto bastou para que o delegado de polícia mandasse tocaiar-me em pleno Ponto Central da cidade, afirmando em altos brados, diante de inúmeras testemunhas, que eu seria fuzilado logo que fosse encontrado”.

Com a deflagração da revolta, que entrou para a história como a Intentona de 35, Hidelbrando voltou a ser perseguido e preso, além de perder o mandato por vários meses. Só foi recuperá-lo em janeiro de 1937, quando entrou na campanha de Armando Sales para presidente da República, eleições abortadas por Vargas.

Estado Novo

Em 10 de novembro de 1937, Getúlio Vargas implantou mais um período ditatorial, o Estado Novo, sob o pretexto que uma conjuração comunista ameaçava o poder.

Essa articulação comunista foi apresentada em documentos e ficou conhecida como Plano Cohen, que depois se descobriu ter sido montada a partir de documentos forjados por um integralista, o capitão Olímpio Mourão Filho.

Como o Estado Novo suspendeu todas as câmaras legislativas do país, Hildebrando retornou às funções de fiscal, trabalhando no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul (como inspetor geral) e depois em São Paulo.

Quando, em 1942, foi deflagrada a 2ª Grande Guerra Mundial, o bravo jornalista de Igreja Nova estava trabalhando em São Paulo como agente fiscal de imposto de consumo, na Recebedoria Federal do Ministério da Fazenda.

Seu nome foi citado no jornal A Manhã de 6 de setembro daquele ano como sendo o porta-voz de um grupo de servidores da Recebedoria que procurou o general Maurício Cardoso para declarar que seus representados estavam dispostos “a prestar o seu concurso, quando necessário, em qualquer setor para onde para onde forem designados, na defesa da integridade e da honra da Pátria estremecida”.

Uma publicação do jornal A Cruz, de 26 de agosto de 1945, do Rio de Janeiro, sob o título de Neruda sequestrado, reproduz texto da revista 7 Dias, de São Paulo, sobre a presença do poeta e senador chileno Pablo Neruda no comício de Carlos Prestes no Estádio do Pacaembu. “Esteve, durante sua permanência na capital paulista, hospedado no Hotel Esplanada, num belo apartamento que lhe foi cedido por Hildebrando Falcão, fiscal federal”.

Nas eleições constituintes de 1945, o jornalista foi o candidato mais votado a deputado federal pelo Partido Republicano Progressista em Alagoas, agremiação presidida por ele em sua terra natal. O PRP não alcançou o quociente eleitoral e ficou sem representação.

Senador Hildebrando Falcão

Redemocratização

Com o fim do Estado Novo, elegeu-se, no pleito suplementar de janeiro de 1947, suplente de senador por Alagoas na legenda do Partido Social Democrático (PSD). Era o companheiro de chapa do senador eleito, o general Pedro Aurélio de Góis Monteiro.

No início de 1948 foi citado pelo jornal A Manhã como diretor do semanário O ABC, onde trabalhava ao lado de jornalistas como Murilo Marroquim, Joel Silveira e Rafael Correia de Oliveira. Era um jornal voltado para grandes reportagens e tinha a colaboração de vários escritores, além das charges de Augusto Pinho.

Em julho de 1950, uma nota do Jornal de Penedo informou que Hildebrando esteve na cidade, e citou ele como “influente prócer do Partido Social Progressista” vindo do Rio de Janeiro, mas que prometera voltar em poucos dias para integrar-se na campanha política em Alagoas.

De fato, voltou antes das eleições de outubro daquele ano, desta feita acompanhando Getúlio Vargas e como candidato a deputado federal pelo Partido Social Democrático (PSD), ficando com a segunda suplência. Vargas queria que ele reorganizasse o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e chegou a nomeá-lo, em agosto, para uma comissão que interveio no diretório estadual do PTB.

Com a posse de Getúlio Vargas em 31 de janeiro de 1951, Hildebrando foi promovido funcionalmente no Ministério da Fazenda e voltou ao Rio de Janeiro.

No dia 4 de janeiro de 1952, o Diário Carioca informou que o “Ministro Hildebrando Falcão” retornava naquela data da Grécia, onde esteve chefiando uma delegação brasileira em Atenas. Na nota ele é tratado como “ilustre diplomata”.

O mesmo jornal voltou a veicular, em 4 de dezembro de 1953, informações sobre a carreira diplomática do alagoano. Desta feita noticiando que durante o expediente do Senado foi lida mensagem presidencial “indicando o diplomata Hildebrando Falcão para ministro do Brasil junto ao governo do Afeganistão”.

O Malho de junho de 1952 informou que o sr. Hildebrando Falcão era o novo Presidente da Fundação Rádio Mauá, que administrava a rádio do mesmo nome.

Era a antiga Rádio Ipanema, que fora de propriedade de alemães e confiscada, ficando subordinada ao Ministério do Trabalho. Surgida no período final do Estado Novo, a rádio veiculou a imagem popular de Getúlio Vargas elaborada pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) e se autodenominou “a emissora do trabalho”.

Na coluna “Flash do dia”, assinada por Augusto Aguiar no jornal A Noite de 11 de agosto de 1952, há a informação de que Hildebrando reequiparia a Rádio, além de transformá-la em “uma estação televisionada”. O presidente da Fundação era tratado como “Esse milionário e simpático cidadão, natural de Alagoas e suplente de deputado que é Hildebrando Falcão — gordo, rico e politiqueiro tremendo, — atualmente na Rádio Mauá, garantiu a este colunista que vai reequipar aquela emissora do Ministério do Trabalho…”.

Em junho de 1953, Hildebrando, ainda presidente da Fundação Rádio Mauá, foi recebido na Prefeitura do Rio de Janeiro representando uma comissão da Associação do Cinema Brasileiro e Jornal do Cinema.

Mesmo dirigindo a Rádio, onde não recebia remuneração, continuava como funcionário do Ministério da Fazenda.

Em agosto de 1953, foi exonerado a pedido. Segundo o jornal A Noite de 14 de agosto de 1953, “o senhor Hidelbrando Falcão deverá, em breve, ser designado para um importante serviço do governo da União”.

A pesquisa não identificou qual foi o importante serviço, mas Hildebrando recebeu a tarefa de fiscalizar e reprimir o “câmbio negro” em todo o país. Entretanto, para tal função só foi nomeado em abril de 1955.

Essa missão não durou muito. No dia 27 do mesmo mês o jornalista foi nomeado, por ato do presidente da República, para exercer a função de inspetor fiscal do imposto de consumo no Estado de São Paulo.

Como tinha ficado na segunda suplência do seu partido nas eleições para deputado federal pelo PSD alagoano em 1950, que elegeu os deputados Medeiros Neto e Mendonça Júnior, Hildebrando assumiu o mandato no início de julho de 1954, após a renúncia de Mendonça Júnior.

Nas eleições outubro daquele mesmo ano, voltou a se submeter as urnas pela UDN, mas não conseguiu ser eleito.

Em novembro, a Gazeta de Notícias divulgou uma pequena nota informando que o deputado, ainda detentor de mandato, iria renunciar na semana seguinte sob a alegação que os subsídios de deputado não chegavam nem à metade do que recebia como Fiscal de Imposto de Consumo. Isso não ocorreu e ele terminou seu curto mandato em janeiro de 1955.

Uma nota publicada no Diário de Notícias de 2 de outubro de 1954, na Coluna Notas Políticas, ao informar sobre as readmissões no serviço público por interesse político, denunciou que o deputado Hildebrando Falcão beneficiou um amigo e um irmão.

O Diário caracterizava o parlamentar como um “suplente feito deputado graças à intervenção pessoal do finado Getúlio Vargas, que mandou dar ao efetivo um lugar de procurador na Prefeitura do Distrito Federal com 33 contos por mês para abrir a vaga”.

Quatro anos antes, Hildebrando havia conseguido que o primeiro suplente, José Maria Melo, fosse nomeado médico do Banco do Brasil, como registrou o Jornal do Comércio do dia 12 de julho de 1951.

Logo após a realização do IV Congresso do Partido Comunista do Brasil, PCB, vários parlamentares se pronunciaram favoravelmente à volta a legalidade do partido. Entre eles o deputado Hildebrando Falcão, como noticiou o jornal Imprensa Popular de 1º de dezembro de 1954: “Sempre fui favorável a que o Partido Comunista funcionasse livremente. Mantenho esse ponto de vista por entender que a melhor prática da democracia é a que assegura o livre debate das ideias”.

Em 7 de dezembro de 1957, Hildebrando novamente foi notícia nos jornais por atividade diplomática. Naquela data foi lida no Senado a mensagem presidencial que o indicava para o cargo de embaixador na Índia.

Voltou a ser candidato, em outubro de 1958, pela legenda da Coligação Nacionalista Democrática — Partido Democrata Cristão (PDC), o Partido Social Progressista (PSP), o Partido Social Trabalhista (PST) e o Partido Socialista Brasileiro (PSB). Ficou novamente na suplência.

Sempre mantendo laços com o jornalismo, em março de 1960, Hildebrando dirigia em parceria com Lourival Coutinho a revista PANFLETO, “órgão de conhecida posição nacionalista, tendo participado ativamente de muitas campanhas patrióticas, como a do petróleo e outras mais”, resumiu o jornal Última Hora de 18 de março de 1960.

Nas eleições de 7 de outubro de 1962, as oposições a Arnon de Melo em Alagoas propõem o nome de Hildebrando Falcão para disputar uma cadeira no Senado. Filiado ao PSP e com o apoio do PTB, conquistou 15.218 votos, ficando na sexta colocação. Nesta eleição saíram vencedores Arnon de Mello (PDC) e Rui Palmeira (UDN).

Hildebrando teve como suplente o paulista vinculado ao PSD, Otacílio Gualberto de Oliveira, tratado em uma nota publicada no Tribuna de Imprensa do dia 16 de outubro de 1962 como uma figura conhecida do “café society” e que “foi atraído a uma aventura eleitoral naquele Estado como candidato a suplente do sr. Hildebrando Falcão, e financiou a campanha deste, que pleiteava uma cadeira no Senado, mas não conseguiu eleger-se”.

Em um telegrama enviado ao jornalista Joel Silveira e publicado em sua coluna no jornal Diário de Notícias em 13 de setembro de 1962, o candidato ao Senado denunciou o clima eleitoral em seu estado: “Alagoas está mergulhada gigantesco rio de lama corrupção eleitoral vg engrossando agora caudaloso afluente Cid Sampaio que vg deixando glorioso Pernambuco vg vem pleitear cadeira deputado Alagoas derramando impressionante custosa propaganda para compra eleitores pt Por intermédio esse bravo jornal lanço veemente protesto contra esse abuso Poder Econômico apelando para quem possa conter essa investida criminosa contra instituições democráticas nossa atormentada Pátria vg Grato Publicar pt Saudações pt Hildebrando Falcão vg candidato Senado Federal”.

Atingido pelo Art. 7º do Ato Institucional nº1, baixado pela junta militar em 9 de abril de 1964, foi aposentado compulsoriamente como agente fiscal do imposto de consumo.

Hildebrando e mais 182 servidores públicos fizeram parte da última relação dos perseguidos pela Ditadura Militar. Sua aposentadoria foi publicada no dia 9 de outubro daquele ano. Ao todo, o AI nº 1 atingiu 3,5 mil militares e civis.

Em março de 1965, o deputado Robson Mendes sofreu um atentado em Palmeira dos Índios, sendo baleado no ombro direito com um tiro de mosquetão disparado pelo pistoleiro Antônio Dá. Após ser atendido pelo médico Marcos Moraes, foi levado ao Rio de Janeiro e recebido por Hildebrando, que o levou ao Hospital Silvestre, onde o ortopedista Donatello Sparvolli reconstitui sua clavícula, como informou o ex-deputado José Costa.

Da mesma forma, Hildebrando atuou em novembro de 1967, quando assassinaram Robson Mendes e feriram sua mãe em Maceió. Dona Eurídice Mendes, que foi levada ao Rio de Janeiro para tratamento de uma bala que ficou encravada a coluna vertebral, ficou hospedada na casa do ex-deputado alagoano.

Em 1968, Hildebrando Falcão externava que passava por dificuldades financeiras. Pelo menos é o que retrata o telegrama enviado por ele ao ministro da Fazenda publicado no Jornal do Comércio de 24 de janeiro daquele ano. Na mensagem ao ministro, o ex-deputado explica que tem direito a receber 1.897,00 cruzeiros velhos referentes à diferença de remuneração do seu cargo de agente fiscal do imposto de consumo.

“Pelo amor de Deus, senhor ministro, ordene o pagamento dessa fabulosa importância para um pobre político em férias, marginalizado injustamente pela Revolução que não ajudei a fazer! O Brasil, embora atualmente psicodélico, ainda pode pagar seus débitos. Eu, com a maldita e esfarrapada economia de um pau-de-arara, não tenho a mesma sorte e vivo acuado pela voracidade canina de credores cruéis. Cubra, senhor ministro, com o capote de sua generosidade bandeirante, as minhas dificuldades e fique certo de que serei sempre amigo e admirador de V. Excia”. O ministro da Fazenda era Delfim Neto e não se sabe se atendeu aos apelos do alagoano.

Em julho de 1980, após o Ministério da Fazenda não receber o pedido de reintegração com base na Lei da Anistia, foram aposentados definitivamente 38 funcionários, entre eles Hildebrando Falcão.

Faleceu no dia 6 de julho de 1971, no Rio de Janeiro. Deixou viúva a ex-miss Alagoas Enid Peixoto Braga Falcão e órfã a alagoana Ana Amélia Braga Falcão, nascida em 1949.

Em sua homenagem surgiram no Clima Bom, em Maceió, a Rua Doutor Hildebrando Falcão, e a Escola Municipal Hildebrando Falcão, em Igreja Nova.

4 Comments on Hildebrando Falcão e a intentona comunista de 1935 em Alagoas

  1. Parabéns pelo zelo a nossa historia

  2. Ethel Cox Viana Mafra // 5 de março de 2017 em 22:41 //

    Muito bom o relato de fatos da história política alagoana desconhecidos por mim.
    Confesso que cansei das peripécias do Sr. Hildebrando Falcão do qual não consegui absorver as ideias, as verdadeiras intenções, de que lado estava.
    Por outro lado, interesso-me saber a trajetória do Partido Comunista em Alagoas pelos anos 30/40. Há alguma publicação que remeta a este fato? Sei que houve muitas perseguições, inclusive no Governo Péricles.
    Obrigada.
    Ethel

  3. Procuro familiares do cb Oseas Pimentel de Almeida meu zap (81) 987073630 Murilo

  4. RODOLFO LEANDRO NASCIMENTO SILVA // 1 de agosto de 2017 em 11:47 //

    Fantástico revival!

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