Alagoas perde Maria Helena Raimundo da Silva
Na manhã do dia 6 de maio de 2014, Maria Helena, como era mais conhecida, entrou na sala da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Alagoas, para falar pela primeira vez em público sobre a sua prisão em 1973. Aparentando muito nervosismo, falou por mais de uma hora para Comissão Estadual da Verdade Jayme Miranda sobre a sua militância no Partido Comunista Revolucionário, PCR, e as circunstâncias que a levaram a ser sequestrada pela equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury, em Maceió.
A economista Maria Helena Raimundo da Silva, que começou sua vida profissional como professora primária, trabalhou por décadas na Secretaria Estadual de Planejamento, destacando-se como uma excelente profissional. A professora Alba Correia, que também teve militância política no mesmo período da sua prisão, lembra dela como uma mulher guerreira e corajosa.
Iniciou sua militância política no PCR quando ainda cursava o primeiro ano de Economia na Ufal, em 1967. No depoimento, revelou que conviveu com Manoel Lisboa, principal liderança do partido. “Fazia questão, lá em casa, de fazer cafezinho para Manoel Lisboa. Foi quando, a partir de 1972, o pessoal do partido começou a ser preso. O pessoal do Recife foi preso. Manoel Lisboa fez uma reunião lá em casa na sexta-feira e no domingo foi preso no Recife”.
Sabendo que também poderia ser presa, avisou a sua mãe e pediu para ela que, se acontecesse, divulgasse para todo mundo. Em um determinado dia, foi chamada ao setor de pessoal da Secretaria de Planejamento, onde já trabalhava desde 1971, para ser informada que o chefe de gabinete havia pedido seu endereço.
Neste mesmo dia, quando voltava para casa no final da tarde, na Rua Firmino Vasconcelos, Ponta da Terra, foi sequestrada por três homens em um carro, que a encapuzaram e a levaram para um local desconhecido. “Eu sei que era um conjunto habitacional, com três homens me ameaçando o tempo todo, mas não vi a cara deles”.
Após três dias no cativeiro, foi interrogada por uma comissão de policiais, entre eles o delegado Sérgio Paranhos Fleury.
— Você conheceu o Manoel Lisboa? — perguntou Fleury.
— Não senhor.
— Nós matamos. Conheceu o Flávio?
— Não senhor.
— Nós matamos.
O reconhecimento do temido delegado Fleury na verdade se deu quando Maria Helena já estava em liberdade. “Dias depois aparece uma fotografia dele no jornal, e eu identifiquei”. Flávio era o codinome de Emmanuel Bezerra, também trucidado no DOI-CODI em São Paulo.
Por sorte, Maria Helena tinha um primo, coronel João Ramalho, que era da cúpula da Segurança Pública em Alagoas e intercedeu por ela junto aos policiais paulistas. Quando foi posta em liberdade e deixada na Praça Lions, um dos sequestradores disse que só estava sendo liberada, “porque na sua família tem um homem de bem”. Por algumas semanas foi obrigada a ir, sempre que convocada, encontrar com um policial que perguntava se alguém do partido tinha feito contato com ela.
Mesmo estando envolvida na militância política de um partido revolucionário, Maria Helena ressaltou que não sofreu perseguição do governo estadual e pôde voltar ao trabalho após sua prisão. “Não teve nenhum problema, muito pelo contrário, quando eu fui ao primeiro dia de trabalho, eu quase que morria sufocada de tanto abraço e de tanta alegria. As outras pessoas que foram presas, foram todas para o Recife. Eu fui privilegiada”, confessou.
Durante o depoimento, Alba Correia lembrou das circunstâncias da prisão de Maria Helena. “Nós estávamos num seminário em Recife, com integrantes da Secretaria da Educação, da Agricultura, do Planejamento, e havia uma companheira do Planejamento, Mara, que também era do PCR, e lá, no Seminário de Olinda, nós assistimos o encontro de Mara com Eneide, que estava foragida”.
Alba recordou ainda que na volta para Maceió, em um domingo, já sabendo da prisão de Selma Bandeira e Eneide, Mara estava muito nervosa e assustada, principalmente quando o ônibus parava. Por precaução, deixaram Eneida na casa do deputado José Bernardes.
“Na segunda-feira nós tínhamos uma reunião na Secretaria de Planejamento e foi aí que a gente encontrou a Helena já de volta da prisão, acompanhada da mãe da Mara, chorando porque Mara não tinha aparecido em casa”, lembra Alba dos momentos de suspense.
Sobre a sua atuação no PCR, Maria Helena revelou que fazia o papel de jornalista, escrevendo artigos para o jornal partidário e redigindo panfletos. “Flávio é que era o nosso dirigente. Ele era quem determinava o que a gente deveria fazer. Eu lembro que eu estava levando um artigo meu para o Recife, e o carro da Polícia Federal parou o ônibus. Mas eu tinha botado a apostilha com o trabalho todo em cima. Eles olharam, olharam, e depois foram embora. Foi dessa vez que eu cheguei e soube que o Manoel Lisboa não estava mais vivo”, acrescentou.
Outra informação importante fornecida por Maria Helena foi sobre a prisão da dra. Hélia Mendes. Havia um mimeógrafo do PCR que, por questões de segurança, ficava escondido na casa de algum conhecido. No período das prisões, Emmanuel Bezerra, o Flávio, levou a pequena impressora para a casa da médica. Ela foi presa e agredida pelos policiais.
Ao final do depoimento, elogiou o trabalho da Comissão da Verdade e disse que é preciso que todos saibam o que aconteceu durante a Ditadura. “Estão aí as novas gerações que precisam tomar conhecimento disso, é preciso que a história tenha um repasse”.
Revelou que casou, teve filhos, e que mesmo sofrendo muita repressão social “faria tudo de novo”. Maria Helena faleceu no dia 16 de janeiro de 2017, vítima de AVC.
Como foi triste o que todo as essas pessoas passaram!!!! Como é indigno o ser humano não poder expressar as suas idéias e sentimentos!!!! A humanidade ….essa…não dá pra entender como um ser “gente” pode torturar, Matar..maltratar….sem se colocar no lugar do outro….que só quer o bem para todos! !!!