As boticas dos Botelhos das Alagoas

Fotografia ilustrativa de uma antiga "pharmacia" no Brasil

Os primeiros nomes dessa família surgiram em Alagoas ainda no início da colonização do Brasil. O mais citado é Cristóvão Botelho, senhor de engenhos em Porto Calvo, que, em 1635, durante a ocupação holandesa, teve seus dois engenhos queimados pelos batavos. Era filho de Baltazar de Almeida Botelho e de Brites Lins, filha de Cristóvão Lins.

Muitos anos depois, outro Botelho também ocupou lugar de destaque nos negócios de Alagoas. Candido de Almeida Botelho teve seu nome publicado pela primeira vez nos jornais de Maceió em 1874. Foi citado como alferes da 6ª Companhia do 2º Batalhão de Infantaria do Distrito de Soledade em Passo de Camaragibe, Alagoas.

Voltou a ser mencionado em 1878. Desta feita pelo Almanak do Ministério da Guerra. Era o “prático de farmácia” contratado para a Enfermaria Militar em Maceió. No ano seguinte recebeu condecoração no exercício dessa função.

Nasceu no ano de 1843, em Maceió. Era filho do vereador e antigo prático em farmácia Joaquim José de Almeida e de Rita Maria do Carmo. Aprendeu com o pai a profissão e em 1880 seu nome estava no Almanak da Província das Alagoas como proprietário de uma “casa de drogas” na Rua do Comércio, nº 122, no mesmo endereço da Drogaria Alagoana de seu genitor.

Mantinha-se na Guarda Nacional, agora como tenente, lotado na 3ª Companhia do 1º Batalhão de Infantaria do Serviço Ativo da capital.

Candido Botelho. Fotografia do livro 50 anos de Administração Municipal. Maceió – Departamento Municipal de Estatística, 1939. Acervo Marcos Vasconcelos Filho

Em agosto de 1882, ainda seguindo os passos do pai, foi candidato a vereador por Maceió, sendo eleito para o quatriênio 1883/87. Tinha início então uma vitoriosa carreira política, que o levou a presidir a Câmara e a ser interinamente intendente da capital (de 5 de abril de 1904 e 7 de janeiro de 1905). Foi também deputado estadual por várias legislaturas — praticamente em todas entre 1899 e 1912.

Quando o médico João Francisco Dias Cabral faleceu em 19 de julho de 1885, foi o vereador Candido Botelho que, dois dias após, apresentou e conseguiu aprovar a mudança do nome da Rua do Reguinho para Rua Dias Cabral. Em 1883, também partiu dela a mudança de nomes da Rua do Apolo e Rua da Floreta para, respectivamente, Rua Mello Moraes e Rua Fernandes de Barros.

Não foi possível identificar quando a Drogaria Alagoana da Rua do Comércio passou a ser a Botica e Drogaria Alagoana na esquina da Rua Cincinato Pinto com a Rua 1º de Março, mas em novembro de 1883 assim já era anunciada nos jornais. Divulgava o Preparado de Jurubeba, além de vinhos, xaropes, pílulas, pomadas, óleos e emplastos. Anos depois (1896), lançou seu licor Cajurupiga, com boas críticas.

Anúncio da Drogaria de Candido Botelho no jornal O Liberal de 1884

Foi ainda o responsável pela elaboração da fórmula da famoso “Formicida Manguaba”, que ajudou a combater a praga das formigas saúvas em Maceió. Um pouco do no formigueiro causava uma reação estranha nesses insetos, levando uns a atacarem os outros ferozmente. Ao final, estavam quase todos mortos ou sem uma parte do corpo.

Em Médicos, Remédios, Dentistas e Barbeiros, Félix Lima Júnior recordou do Candido Botelho negociando na rua Cincinato Pinto, nº 18, “onde ele, além de drogas, vendia mangas e cocos de seu sítio na margem do canal e fabricava tinta de escrever, azul-negra, marca “Brasilina”. Revelou ainda que ele era mais conhecido como “seu Candinho” ou “Goiamum Amarrado”.

A partir de 1890, expandiu seus negócios ao montar uma tipografia, sob os cuidados de Pedro Xavier Lisboa, para nela imprimir o Almanak Industrial Alagoano, com 36 páginas. O jornal O Orbe de 1896, ao receber cinco exemplares do periódico, agradeceu e comentou: “Além de muitos anúncios referentes a sua antiga, e acreditada Farmácia, tivemos a satisfação de lermos anedotas e uma boa parte literária. Traz também em suas páginas apreciáveis clichês feitos pelo hábil artista sr. João Bina”.

Em 1897, o jornal Holophote também recebeu o Almanak e o crucificou: “O trabalho de composição tipográfica, desprezando algumas irregularidades, está sofrível e a impressão, cremos que devido à grande porção de tinta que empregou o hábil profissional que a executou, apresenta muitos defeitos”.

Outro espaço importante ocupado pelo farmacêutico Candido Botelho foi o de provedor da Santa Casa de Misericórdia de Maceió. Ocupava esse cargo em 1905.

Faculdade de Medicina e Farmácia da Bahia, onde o Arthur de Almeida Botelho foi diplomado em 1890

Arthur de Almeida Botelho

O segundo membro da família Almeida Botelho a se destacar, nesse mesmo período em Maceió, foi Arthur de Almeida Botelho. Sabe-se que nasceu na capital em 12 de setembro de 1864 e que era filho de Francisca Maria da Conceição (+28 de maio de 1905).

Em um dos jornais da época foi citado como filho adotivo do farmacêutico Cândido Botelho, a quem seguiu na profissão, mas não como “prático”. Concluiu o curso na Faculdade de Farmácia da Bahia em 1890.

Seu envolvimento com Cândido Botelho o levou, após voltar a Maceió, a partilhar com ele a firma Candido Botelho & Cia., proprietária da Farmácia e Drogaria Alagoana.

Anos depois já era proprietário da Farmácia Popular em Jaraguá, com a firma Arthur Botelho & Cia. Em dezembro de 1907 instalou a Farmácia Nacional, em frente à Igreja do Livramento, na futura Praça D. Rosa da Fonseca, depois Bar do Chopp, no Centro de Maceió. É citado como tendo participado de várias cirurgias, funcionando como anestesista.

Pharmacia Brasil, na Rua do Livramento, onde antes funcionou a Pharmacia Nacional de Arthur de Almeida Botelho

Também recebeu de seu orientador o gosto pela política, o que levou a conquistar mandato de vereador em Maceió em meados da primeira década do século XX.

Em 1895 casou-se com Isabel Caldas Botelho, que nasceu em 20 de novembro de 1876 e faleceu em 2 de julho de 1906 aos 31 anos de idade. Era filha de Izabel Cotrim Caldas e de Antônio Pereira Caldas (+1914), um comerciante, com loja de ferragens na Rua do Comércio, que também foi tesoureiro da Recebedoria em Maceió.

O casal Arthur e Isabel teve as seguintes filhas: Guiomar e Celina (gêmeas), em 18 de janeiro de 1896; Maria Dagmar (*1897); Noemia (*13 de fevereiro de 1901); Beatriz (*21 de agosto de 1902); Jandyra (*30 de janeiro de 1904); Maria Anunciada (*26 de março de 1905); e Isabel, que nasceu dias antes do falecimento da mãe. Maria Anunciada casou-se com o senador alagoano Ezechias da Rocha.

Em 29 de fevereiro de 1908, o viúvo Arthur Botelho casou-se com Francisca Pereira Caldas, irmã de sua primeira esposa. Francisca faleceu no dia 6 de outubro de 1931 em Recife.

Em julho de 1909 já não era mais o proprietário da Farmácia Nacional, situada na Pracinha do Livramento. Em seu lugar surgiu a poderosa Farmácia Brasil, de Alexandre Archeláo da Silva Reis, que foi provedor da Santa Casa de Misericórdia de Maceió.

Rua do Comércio em Quebrangulo

Pouco tempo depois Arthur Botelho surge nos jornais como dono de uma farmácia em Vitória, atual município de Quebrangulo, em Alagoas.

Renato de Alencar, em artigo para A Gazeta da Farmácia de agosto de 1954, lembra que em 1915, aos 20 anos de idade, chegou a Quebrangulo para ali fundar um colégio. Foi bem recebido e contou com a ajuda do farmacêutico dr. Artur Botelho, assim tratado por suas múltiplas funções, reconhecido como médico, parteiro, dentista e hipnotizador, além de professar o espiritismo.

Foi avaliado como um “homem boníssimo, sempre jovial, culto, amigo de todo mundo, não tinha dia nem hora para atender os que batiam em sua porta”. A calçada da sua farmácia era o clube, o legislativo e o centro cultural e dos fuxicos da sociedade local.

Em março de 1921, Arthur Botelho criou em Quebrangulo, em parceria com o dr. Lívio Vieira da Cunha (juiz substituto em Vitória) e com o comendador Leopoldino Silva, um instituto de ensino destinado à infância desamparada.

Faleceu no início de julho de 1923 em Viçosa, município vizinho. Estava prestes a completar 59 anos de idade.

Arthur Botelho de Barros

Poucos meses após a morte do dr. Arthur, nascia em Quebrangulo outro Arthur Botelho que conseguiria também reconhecimento público.

Arthur Botelho de Barros nasceu no dia 25 de maio de 1924, filho do tabelião Antônio de Barros Passos (*1888 +1938) e de Julieta Botelho de Barros, agente dos Correios em Quebrangulo. Era neto do dr. Arthur e perdeu o pai muito criança.

Iniciou seus estudos e a rabiscar seus primeiros desenhos em Quebrangulo. Acompanhou a mãe quando transferida para o Pilar e depois para o bairro de Bebedouro, em Maceió, onde concluiu o primário e matriculou-se no secundário. Entretanto, constituiu toda a base de sua cultura como autodidata. A renda da família, com a morte precoce do seu pai, não lhe permitiu voos maiores no ensino.

Arthur Botelho de Barros em 1947, no Rio de Janeiro

Quando estudante em Maceió, passou a exibir para os amigos os resultados de seus trabalhos. Foi então aconselhado a procurar um mestre da pintura avaliar o que produzia e orientá-lo. O primeiro que consultou, bateu em seu ombro e disse que não tinha nada para ensiná-lo. Já o considerava como um mestre.

Em julho de 1947, com 23 anos de idade, estando no Rio de Janeiro para um curso de topografia, passou a colaborar com a revista Rádio Visão. A edição de 15 de julho daquele ano publicou seus alguns dos desenhos e ilustrações (veja abaixo).

Voltou ao Rio de Janeiro em 13 de outubro de 1949. Fora convidado a expor os seus trabalhos pela renomada atriz Dulcina de Morais, contando com o patrocínio da Casa dos Artistas, detentora da receita da exposição.

Sua mostra ocorreu no saguão do Teatro Regina entre e 15 de dezembro de 1949. Era sua primeira exposição no Rio de Janeiro. Foram apresentados mais de 20 quadros e uma centena de desenhos das estrelas do rádio e do cinema.

A crítica assim avaliou seus desenhos e pinturas: “A fina sociedade do Rio de Janeiro foi surpreendida, belamente, neste fim de ano, pelos novos primores da arte nacional de Arthur Botelho de Barros. Este genial artista do pincel, na idade das ilusões, tem o poder mágico de transmitir à fisionomia humana, por meio de sugestivos retratos, a máxima verossimilhança, a expressão da própria vida. Sua exposição atual é um dos mais raros acontecimentos artísticos de 1949 no Brasil”.

A imprensa também destacava que o artista não tinha frequentado nenhum curso artístico e nem teve professor que lhe orientasse nas lições de pintura ou desenho. Desenhava utilizando o lápis Faber nº 1 e os resultados eram tão espetaculares que alguns críticos duvidaram ser mesmo um desenho.

Em 1º de janeiro de 1950 há o registro de sua presença num almoço em comemoração ao Ano Bom, oferecido pelo jornalista A. de Medeiros Gualter, em sua residência. Foi tratado na nota que divulgou a festa como “o jovem pintor Artur Botelho”.

Pelo Decreto nº 66.817, de 1º de julho de 1970, assinado pelo presidente Médici, sabe-se que era funcionário do quadro permanente do Ministério da Saúde e que deixava de ser da classe de Correntista AF-203.7 para ser enquadrado na série de classes de Desenhista, P-1001. Aposentou-se em 1986.

Arthur Botelho desenhado pelo próprio

Ilustração de Arthur Botelho para a revista Rádio Visão de 15 de julho de 1947

Charge de Arthur Botelho para a revista Rádio Visão de 15 de julho de 1947

Painel de Arthur Botelho em homenagem a Getúlio Vargas

2 Comments on As boticas dos Botelhos das Alagoas

  1. Lula Nogueira // 19 de dezembro de 2023 em 07:21 //

    Gostei de saber do pintor Arthur Botelho….
    Maria Anunciada , filha de Artur e isabel…viveu 101 anis… viuva do senador aagoamo Ezechias da Rocha …morava no Rio de Janeiro

  2. Claudio de Mendonça Ribeiro // 19 de dezembro de 2023 em 16:27 //

    Parabéns, prezado Ticianeli.

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