Edécio Lopes e as Manhãs Brasileiras
Edécio Lopes Vasconcelos nasceu no dia 1º de setembro de 1933 em Apoti, município de Glória do Goitá, Pernambuco. Era o filho mais velho de Severino Lopes e de Almira de Melo Lopes.
Criado numa família pobre, aprendeu ainda criança o valor do trabalho. Ajudava nos ganhos como “moleque de recados” e realizando pequenas compras para os vizinhos, cujas casas também frequentava para ouvir os programas de rádio. Desse apego à atividade radiofônica herdou o apelido de “Rádio Clube”.
Na juventude, continuou seu vínculo com o rádio, principalmente com a música. Nas serenatas da cidade cantava pelas ruas o que ouvia dos seus ídolos. Os sucessos de Orlando Silva eram entoados devidamente acompanhados pelos violões de Biúca ou Eduardo.
Mesmo gostando de uma boa leitura e se destacando no curso primário por suas boas notas, não teve condições de se manter na escola por muito tempo. Quando já morava em Recife, no bairro de Tejipió, tentou fazer o Exame de Admissão, exigido para ter acesso ao curso ginasial, mas seu trabalho como cobrador de ônibus o impediu.
Seu aprendizado maior se deu mesmo nos batentes da vida: foi garçom, limpou telhados, varreu quintais, operário numa fábrica de café moído em Feira Nova, município vizinho de Glória do Goitá em Pernambuco.
Ainda em Feira Nova, foi contratado pela Prefeitura como professor para educar crianças em um dos sítios próximos da cidade. Como o prefeito não pagava os salários de ninguém, começou a ter dificuldades para se alimentar, chegando a passar fome, o que o levou a desmaiar em plena feira semanal da cidade.
Foi então que resolveu tentar a vida em Limoeiro, distante apenas 13 quilômetros.
Ingressando no Rádio
Sabendo que a Rádio Difusora de Limoeiro estava contratando atores para montar sua equipe de radioteatro, pegou carona no primeiro caminhão que encontrou e foi se submeter ao teste. Leu uma radiofonização de Brasil Caboclo de Zé da Luz e foi aprovado, passando a receber um ordenado de 600 cruzeiros.
Mas o destino o queria como locutor e pregou-lhe uma peça. Certo dia, na hora de reiniciar o segundo período de transmissões, das 17h às 21h — o primeiro tinha sido das 9h às 13h — não havia locutor na estação. A Difusora de Limoeiro estava há poucos dias no ar e ainda sofria com a desorganização natural da fase de implantação.
Diante do problema, o diretor da emissora chamou o jovem radioator recém-contratado, lhe entregou uma pasta com vários textos e o jogou no ar. Era o dia 3 de novembro de 1952, primeiro dia como locutor de Edécio Lopes.
Mesmo após essa promoção, o mais jovem locutor de Limoeiro continuava a ter uma vida miserável. Seu ordenado mal dava para se alimentar. Dormia numa estrebaria e só tinha uma roupa, que lavava antes de dormir. O salário melhorou um pouco quando o discotecário da Rádio teve que sair inesperadamente da cidade por questões políticas e esta tarefa também foi repassada para ele. Passou a receber mil cruzeiros de ordenado por acumulo de função.
O segundo aumento de salário também foi provocado por questões políticas. Mas desta feita o envolvido foi o próprio Edécio. Por ter lido ao microfone uma nota contra o governador Etelvino Lins, foi preso. Como a divulgação tinha sido autorizada pelo dono da rádio, coronel Chico Heráclio, foi premiado com a direção artística da emissora e um ordenado de três mil cruzeiros.
Nesta rádio apresentou ainda programas de auditório, onde também cantava.
Com mais experiência, transferiu-se para a Rádio Difusora de Caruaru, onde permaneceu por pouco tempo. Foi contratado pela PRA-8, Rádio Clube de Pernambuco, para atuar nos departamentos de esportes e notícias.
Em sua trajetória no rádio pernambucano, Edécio trabalhou nos seguintes veículos de comunicação: Rádio Difusora de Limoeiro, Rádio Clube de Pernambuco, Rádio Jornal do Comércio, Rádio Tamandaré, Rádio Planalto de Carpina, Rádio Difusora de Caruaru e Radio Liberdade de Caruaru.
Em Alagoas
Contratado para trabalhar na Rádio Difusora de Alagoas, chegou em Maceió no trágico dia do tiroteio na Assembleia Legislativa, 13 de setembro de 1957. Ele descreveu assim aquele momento: “Meia hora depois de chegar, ouvi um barulho diferente. Perguntei a minha Tia Olímpia, que residia na rua do Macena, o que é que estava havendo e ela, com a maior tranquilidade respondeu que eram metralhadoras na Assembleia. O que me assombrou não foi o fato de serem metralhadoras, mas a tranquilidade como me foi dito”.
Com a crise política instalada e a Rádio Difusora sem pagar seus salários, voltou para Limoeiro, onde casou-se, no dia 8 de dezembro daquele mesmo ano, com Olindina Rodrigues Lopes. Tiveram quatro filhos, Ednéia, Edmilson, Edvaldo e Ednaldo. Trabalhou nesse período como locutor de um serviço de alto-falantes.
Um ano depois, em setembro de 1958, estava de volta a Maceió. Atendendo ao convite de Castro Filho e de Sizenando Nabuco, foi contratado para ser o gerente de operações da Rádio Progresso de Alagoas, que havia sido inaugurada poucos meses antes, em 15 de janeiro de 1958. A rádio era do deputado federal Ary Pitombo.
Pouco tempo depois foi levado novamente para a Rádio Difusora de Alagoas ganhando sete mil cruzeiros por mês, além de um emprego no Tribunal de Contas. Edécio revelou em seus escritos memorialísticos as razões que o levaram a deixar a Difusora dois anos depois: “Ganhei, além desse emprego e das boas amizades, por culpa do atraso nos vencimentos da Emissora, uma mancha no pulmão, uma fraqueza daquelas e tive que ir embora de Maceió”.
Para recuperar a saúde foi para Carpina, Pernambuco, cidade escolhida por ter clima agradável. Lá trabalhou durante dois anos na Rádio Planalto, uma emissora católica.
Com a saúde em dia foi para Caruaru, ingressando na Rádio Cultura do Nordeste, onde começou a fazer crônica política. Ainda em Caruaru, em meados dos anos de 1960, montou a Rádio Liberdade. Um ano depois foi contratado pelas Emissoras Associadas pensando que iria para o Recife. No começo de 1967 estava de volta à Maceió e novamente na Rádio Progresso.
Após sete meses na Progresso, foi contratado pela Organização Arnon de Mello, passando a atuar na Rádio Gazeta de Alagoas, onde escreveu as páginas mais importantes de sua história no rádio alagoano.
Em Alagoas, atuou na Rádio Difusora de Alagoas, Rádio Progresso de Alagoas, Rádio Palmares de Alagoas, Rádio Gazeta de Alagoas AM, Rádio Gazeta FM, Rádio Jornal de Hoje FM, Rádio Manguaba AM e Rádio Educativa FM. Foi diretor da TV Gazeta de Alagoas e da Rádio Gazeta FM.
Manhãs Brasileiras
Ainda estava na Rádio Liberdade de Caruaru, quando criou o programa Manhãs Brasileiras, que foi ao ar pela primeira vez no dia 12 de outubro de 1965.
É considerado o programa diário com mais tempo de execução do rádio brasileiro. Foram 43 anos e aproximadamente 12.300 audições em várias estações, sempre com um único apresentador: Edécio Lopes.
Em Alagoas, o Manhãs Brasileiras fez história. Durante décadas, a voz inconfundível do seu apresentador entrava nas casas no início da manhã e anunciava:
“Muito bom dia senhoras e senhores, estamos começando mais uma edição do programa Manhãs Brasileiras…”.
A trilha sonora era a música “Brasil”, de Benedito Lacerda e Aldo Cabral, de 1939, nas vozes de Francisco Alves e Dalva de Oliveira.
Manhãs Brasileiras, sempre executando músicas de boa qualidade, teve sua importância também pelos comentários sobre os diversos problemas do Estado de Alagoas. Suas entrevistas e debates com as autoridades da política e da economia alagoana faziam a cidade parar.
Outra característica que levou o programa a ser referência política em Alagoas foi a postura democrática do seu apresentador, abrindo espaços para todas as lideranças da sociedade.
Durante a Ditadura Militar, mesmo tendo suas opções políticas muito bem definidas e trabalhando em emissoras cujos proprietários apoiavam o governo, corajosamente deu voz às forças políticas oposicionistas.
Os últimos momentos do programa aconteceram nas emissoras do Instituto Zumbi dos Palmares (IZP), instituição do governo estadual alagoano. O maior período foi na Rádio Educativa FM, onde foi apresentado até o dia 9 de abril de 2007, quando sua transmissão ao vivo foi interrompida por ordem da direção do IZP, nos primeiros meses do governo de Teotônio Vilela Filho. Ele estaria contrariando determinação superior que havia estabelecido que o programa teria que ser gravado.
Foi convencido a continuar com o Manhãs Brasileiras na Rádio Difusora. Aceitou a contragosto. Argumentava para os mais próximos que a Rádio FM permitia melhor qualidade musical.
Depois deste episódio não escondia a sua tristeza e decepção. Esperava chegar ao final de sua trajetória de radialista sendo mais respeitado. Manhãs Brasileiras sobreviveu até o dia 13 de agosto de 2008, quando um AVC tirou os movimentos, calou a voz e fechou os olhos de Edécio Lopes. Permaneceu em coma até 21 de janeiro de 2009, quando definitivamente nos deixou.
Música
Edécio Lopes era apaixonado pela boa música e principalmente pelo frevo. No rádio, não perdia oportunidade para divulgar as músicas de carnaval. Não é exagero afirmar que por algumas décadas o carnaval de rua em Maceió existiu graças ao seu empenho e contribuição.
Essa adoração pelo frevo o levou a compor músicas que fizeram muito sucesso em Alagoas. As mais conhecidas são: Cidade Sorriso, “Marceió”, Olha a Cara Dele, Galo da Pajuçara, Vou Sair do Mapa, Carnaval de Vitória, Toque de Reunir, Lembre de Mim, Assim se Passaram Dez Anos, Ói Nós Aqui de Novo, Princesa do Capibaribe, Despedida e Tão Bonzinho.
OUÇA AQUI A MÚSICA “LEMBRE DE MIM”
Também foi o idealizador e organizador de vários festivais e encontros musicais.
Em 2017, o jornalista e radialista Wagner Lima produziu a rádio reportagem “Histórias Documentadas” contando a trajetória de Edécio Lopes no rádio. Ouça esse excelente trabalho aqui:
Conheci Edécio Lopes já trabalhando na Radio Difusora de Limoeiro e acompanhei por muitos anos sua trajetória radialista. A Ultima vez que o vi foi na residência do amigo Zé Galego que é casado com Dainha que é irmã da esposa de Edécio. Resta agora a saudade deste grande radialista que rompeu fronteiras.
Agradecemos a publicação de sua história de vida. Foi sempre um amante desta terra e é com muita honra que vemos o seu nome fazer parte da história das Alagoas.
Foi um privilégio ter conhecido o caríssimo Edécio e com ele ter trabalhado na EMATUR, tornando-o um exponencial amigo. Sob a batuta de Caio Porto estávamos juntos com Edécio, Dydha e o Coronel Almeida.
Bons e inesquecíveis tempos quando tive a honra maior de conviver com tão exponenciais amigos.
Amigo, cunhado, irmão, muitas saudades.
Certa vez, tive o prazer de receber Edécio Lopes, em minha residência situada na Pça. Ciro Acioly, no bairro da Levada, por ocasião da exibição do Arraial dos Guaicurus, que participava de um campeonato de Arraial promovido pela Prefeitura de Maceió, no mês de Junho de 1975/76. Na ocasião ele estava na companhia de Fernando Collor, a quem ele me apresentou. Eu já o conhecia e o admirava, tanto pelo tipo educado de pessoa que era, como por seu talento como homem de rádio. Morreu quando ainda tinha muita coisa a produzir. Uma penas!
Sou fã de Edécio. Certa vez ele me fez um convite!. Disse que minha voz era perfeita para o rádio e sendo assim, “já estava na frente”!. Bom, como eu era muito novo, não levei muito a sério sua visão e não dei importância. Lembranças à parte, Edécio foi certamente uma das pessoas mais inteligentes que conheci. Fico feliz por sua história e seu legado estarem presentes na cultura alagoana e pernambucana.
Fomos vizinhos na Rua da Aurora, em Limoeiro. Edécio foi um vencedor, merecendo tudo o que conquistou com o seu talento, a sua coragem, a sua simpatia. Além de locutor, destacou-se como apresentador de programas de auditório,
Edecio Lopes faz parte da história de Alagoas com o seu “Manhãs Brasileira” que eu acompanhava ainda criança junto com meu pai, aprendi a gostar de MPB ouvindo seu programa, adorava suas críticas defendendo nosso frevo e a MPB.
Tive o prazer de trabalhar com Edécio Lopes na TV Gazeta logo no período da inauguração (1975). Estudei, quando criança, com a filha dele no Colégio da Imaculada Conceição, Pajuçara. Lembro do nome dela como Edméia e não Ednéia…
Ouvi muito no rádio do meu carro “Manhas Brasileiras” com a belíssima musica de abertura – Brasil – Francisco Alves e Dalva de Oliveira – no trajeto para o meu trabalho. Gostava do seu “Muito bom dia” e quando lia as noticias dos jornais do dia. Um mestre na arte da comunicação.
Também estudei no Cesmac e fui contemporâneo do filho dele, o Ednaldo. 1982/1986
Bom dia! Exatamente hoje 1 de setembro de 2023, tive o prazer de ler e ouvir a história de Edécio Lopes. Por acaso estava vendo um rell sobre o bairro Pinheiro em São Paulo e lá via a escola que tinha como nome Radialista Edécio Lopes. Por curiosidade fui pesquisar e encontrei no História de Alagoas a história desse grande homem da comunicação brasileira. E pra mim o mais curioso é que seu Edécio completaria exatamente hoje 90 anos. Minhas saudações e respeito póstumas a Edécio Lopes 👏👏👏
Inesquecível o chato do EDécio
LOPES, UMA CULTURA E UM CONHECIMENTO SEM MEDIDAS.
UM PERBAMBUCANO DE NASCIMENTO, UM ALAGOANO DE
CORAÇÃO. . . ADORAVA OUVIR
SEUS PROGRAMAS “MANHÃS BRASILEIRAS ”
DESCANSE EM PAZ, EDÉCIO LOPES