José Moura Rocha, um guerreiro das causas nobres da justiça social
Nasceu em Capela, Alagoas, “nos idos de 1932”, como ele próprio declarou. Seu pai, Pedro Araújo Rocha, quando Moura Rocha nasceu, estava desempregado após dar baixa na Marinha de Guerra, onde cumprira o serviço militar no encouraçado Minas Gerais.
Sua mãe, Cora (Corália), filha de Manoel Brandão de Moura, o Né Moura, proprietário de uma fazenda de cana de açúcar nas proximidades da foz do Rio Paraibinha, quando este se joga no Rio Paraíba, em Capela.
Ainda criança foi morar em Capela com a família. Era tratado por seus familiares como Nehemias, em homenagem ao avô paterno. Foi o próprio Moura quem alterou seu nome de batismo.
Entrou no Cartório da Rua Pedro Paulino, em Capela, e, impostando a voz, disse:
— Seu Artur Francino, Nehemias é nome de doença… O pai mandou o senhor fazer o registro sem essa anemia.
Saiu da instituição de registro como José Moura Rocha. E assim frequentou a Escola do Padre Monteiro e depois a escola elementar na vizinha Viçosa.
Era ainda um jovem, quando a família foi morar em Maceió, onde montaram uma pensão em um pequeno sobrado situado na esquina da Rua da Alegria com o Beco São José. Foi na pensão que recebeu do pai o livro As Aventuras de Robson Crusoé, a sua “primeira, fértil e contagiante leitura”, como reconheceu anos depois.
Na capital foi estudar no Colégio Diocesano, dos irmãos Maristas, na Rua do Macena, nº 69. Local em cuja vizinhança foi morar após o fechamento da pensão. Foi nesta nova casa que perdeu o pai no dia 6 de agosto de 1942, quando este tinha apenas 32 anos de idade
Com a morte do pai, Moura, sua irmã Sofia, que nascera em 1941, e sua mãe, voltaram a morar em Capela. Nesta época, sem eles saberem, já vivia em Maceió outra irmã por parte de pai. Tércia, nasceu antes de Sofia.
Em Capela, com a ajuda do avô, instalaram uma bodega. Moura foi estudar no Grupo Escolar Torquato Cabral, instituição dirigida por Stella Cabral de Almeida.
Voltou a morar em Maceió após ser aprovado no exame de admissão ao ginásio no Colégio Guido e ter ganho uma bolsa graças à intervenção do seu primo Humberto Cavalcante, que tinha amizade com o Padre Teófanes, diretor daquela instituição de ensino.
Passou a residir na Rua Saldanha da Gama, próximo ao Guido, na casa de uma família maranhense que havia se hospedado anos antes na pensão de sua mãe.
Sapatos, fardas, livros, roupas eram herdados principalmente de um primo mais aquinhoado.
Pouco tempo depois foi morar com sua tia Betinha, mãe do então seminarista Humberto Cavalcante, na Rua General Hermes, bairro da Cambona.
Sua primeira atividade como militante político ocorreu em 1946, quando passava as férias em Capela: organizou com amigos uma manifestação em defesa da campanha d’O Petróleo é Nosso.
Havia sido inspirado na oratória do dr. Sebastião da Hora, que participará com brilho de ato em comemoração à fim da Segunda Guerra Mundial em Maceió.
Em 1948, já morando com a mãe em Maceió, que voltou a abrir uma pensão, agora na Rua Dias Cabral, nº 58, concluiu o ginásio e iniciou os chamados preparatórios para o vestibular de Engenharia.
Estudava no período noturno para poder trabalhar na secretaria do Colégio Guido e ter algum dinheiro para adquirir livros e outros materiais de estudo. Por ter este vínculo com o Colégio, também deu aulas no curso que preparava alunos para o exame de Admissão Ginásio.
Prestou serviço ainda na Companhia Nacional de Navegação Costeira.
No final do curso preparatório, desistiu da Engenharia e optou por estudar Direito. Era o único curso superior a funcionar em Alagoas.
Coincidiu que ao concluir o preparatório, também foi aprovado em concurso para o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos industriários (IAPI). Na inscrição, escolheu como segunda opção a sua locação no Rio de Janeiro.
Na política, filiado ao PSB, ouvia semanalmente as palestras proferidas por Aurélio Vianna na sede do partido, sobrado da Casa Normande, na Rua do Comércio.
Resultado do seu engajamento político foi a fundação, em 1948, da União Estadual dos Estudantes Secundários de Alagoas (UESA). Seus companheiros nessa empreitada foram Igor Tenório, Theobaldo Barbosa, Eraldo Malta, Murilo Vaz e outros. No ano seguinte, foi eleito presidente da entidade.
No início de 1952, foi aprovado para o curso de Direito em Maceió. Nesse mesmo ano foi escolhido delegado ao Congresso da União Nacional dos Estudantes em Goiânia e começou a participar da Juventude Comunista.
Chamado para assumir seu emprego no IAPI do Rio de Janeiro ainda em 1952, Moura precisou pedir ajuda ao deputado Oséas Cardoso para conseguir uma passagem pela Legião Brasileira de Assistência.
No Rio de Janeiro, onde chegou com 20 anos de idade, encontrou uma forma de voltar a Alagoas. Permutou com seu primo Cleófas de Moura Rizzo a lotação e foi transferido para Rio Largo.
Foi em Rio Largo, quando ainda pouco sabia sobre Direito, que recebeu do juiz dr. Oswaldo Miranda a incumbência de realizar a defesa dativa de alguns réus. Do advogado e diretor do Ginásio Municipal Judite Paiva, dr. Jovino Lyra, ganhou a tarefa de lecionar português e de preparar turmas para concursos ensinando a mesma disciplina e mais a Matemática.
Ainda no primeiro semestre de 1952, em Rio Largo, proferiu uma palestra para aproximadamente 20 jovens sobre a vida do líder comunista Luís Carlos Prestes. Desde então passou a ter livros apreendidos e ser vigiado pelo delegado de Polícia do município.
Em Rio Largo conheceu Ibelza Barbosa, com quem se casaria em 1955.
Após o fim do período de permuta de um ano, Moura voltou ao Rio de Janeiro. Onde retomou os estudos na Faculdade Nacional de Direito e à militância estudantil.
No segundo semestre de 1953, por suas participações no Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (CACO), foi acusado pelo jornal O Globo de ter sido transferido pelo Partido Comunista de sua terra natal para reorganizá-lo naquela Faculdade.
Deixou o movimento estudantil em 1956 para estagiar e receber o diploma no final daquele ano. Trabalhou inicialmente com Sinval Palmeira e depois com Calheiros Bonfim. Nesse período cursou uma pós-graduação no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB).
Após conviver por um ano com o alagoano Calheiros Bomfim, se associou a o colega Márcio Augusto Ribeiro Maciel e abriram um escritório de advocacia no Rio de Janeiro. Também durou pouco. Márcio teve que se dedicar aos estudos para prestar vestibular da carreira diplomática.
Em 1959, após alguns anos de atividade advocatícia autônoma foi convidado a assessorar o recém-eleito deputado federal Abrahão Moura. Murilo Rocha Mendes e Humberto Cavalcante foram os responsáveis por sua indicação.
Com prestígio no governo federal, Abrahão conseguiu que Moura fosse transferido do IAPI para o Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERU) em Alagoas. Era um órgão ligado ao Ministério da Saúde.
Quando, em 196o, Abrahão se preparava para ser o candidato de Muniz Falcão ao governo do Estado, Moura foi deslocado para Maceió.
Ibelza Barbosa Moura, com quem se casara em 1955, não gostou da ideia e ainda tentou permanecer no Rio de Janeiro com o filho Bruno, nascido em 1956. Mas não demorou a se juntar ao marido em Alagoas.
Em Maceió, Moura foi contratado com bom salário para ensinar História Econômica do Brasil na Escola de Comércio. Já havia rompido com a Juventude Comunista por não concordar com falta de liberdade de discussão do Relatório do XX Congresso do PCUS.
Em 1961, houve mudança no Ministério da Saúde e Moura foi convidado a retornar ao seu posto no Rio de Janeiro. Não foi e Abrahão Moura, para compensar, indicou-o como procurador da Assembleia Legislativa Estadual.
Quando ocorreu o Golpe Militar de 1964, Moura Rocha não mais se posicionava como na juventude. “Não constituíamos, contudo, ameaça a ninguém; a perversa sociedade dominante, um dos sustentáculos do chamado Brasil oficial, podia dormir de portas escancaradas. Trabalhávamos; criávamos os filhos; imaginávamos ajudar o próximo, socialmente”, declarou no livro Os ricos tugem e os pobres mugem.
De nada adiantou seu afastamento da militância socialista. Foi perseguido e preso em 21 de abril de 1964, quando já era pai de mais dois filhos: Breno, que nasceu em 1962, e Bolívar, em março de 1964.
Da mesma forma, Abrahão Moura foi atingido e em outubro de 1966 perdeu o mandato de deputado federal.
Posto em liberdade no início de 1965, José Moura Rocha retomou suas atividades advocatícias e reassumiu seu cargo de professor contratado da Faculdade de Direito de Alagoas.
Quando parecia que sua vida retornaria à normalidade, foi preso novamente na tarde do dia 6 de abril de 1965. Desta feita a acusação era a de ser o autor intelectual do assassinato do secretário de Segurança Pública de Alagoas, Luiz Augusto de Castro e Silva, o Tininho.
“Um furacão, a partir desse dia, varreria nosso lar, açoitando nossa frágil família”, lamentou Moura Rocha.
Quem matou Tininho?
O advogado José de Oliveira Costa, que também foi preso ao tentar defender Moura Rocha quando este ainda estava incomunicável — depois o defendeu no processo —, aponta que o motivo do crime de Tininho foi a disputa entre as facções que tentavam controlar a segurança pública em Alagoas.
Em depoimento para uma plateia de estudantes e professores da Ufal durante a Mesa Redonda História Reveladas pelos Presos Políticos e Familiares, realizada no dia 31 de março de 2014, no Auditório da Reitoria da Ufal, o ex-deputado federal esclareceu as circunstâncias da morte do secretário.
“Um determinado dia em 1964, o delegado Rubens Quintella foi informado que três pessoas estavam nas imediações do Clube Fênix aguardando a saída dele para matá-lo, e que estas pessoas estavam ali a mando de outro delegado de Polícia, Albérico Barros, o Barrinhos, um matador exímio. Quintella conseguiu prender essas três pessoas, que foram eliminadas, mas com elas foram encontradas carteiras de porte armas concedidas pelo secretário Tininho. Rubens Quintella entendeu que a emboscada que ele estava sofrendo tinha como autor intelectual o Barrinhos”, destacou José Costa.
Revelou ainda que Barrinhos morreu assassinado logo em seguida, em julho de 1964, e o seu executor também foi eliminado.
Sobre a morte de Tininho, José Costa indicou o mandante: “E aí resolvem apurar o crime e dr. Rubens, que teria sido o autor intelectual desse crime, apurou a autoria em cima do dr. José Moura Rocha, alegando que a morte do Tininho, um notório anticomunista, era um atentado terrorista, coisa de comunista”.
Essas mesmas razões apontadas por José Costa surgiram subliminarmente em algumas reportagens da época. Um jornal pernambucano informava que o bacharel Luiz Augusto de Castro e Silva “vinha imprimindo uma ação enérgica à frente da sua pasta, disposto mesmo a desvendar crimes bárbaros que estavam impunes, como a eliminação do chefe da Polinter, Albérico Barros”.
Julgamento
O julgamento, que teve início às 14 horas do dia 21 de junho de 1966, foi presidido pelo juiz Gerson Omena Bezerra e teve transmissão ao vivo pelo rádio. Moura Rocha fez sua autodefesa e contou ainda com a atuação do advogado José de Oliveira Costa e do advogado e professor Francisco Oscar Penteado Stevenson, da Faculdade Nacional de Direito. Atuaram na acusação o promotor João Batista Góes e o advogado João Uchôa.
Em sua defesa, Moura explorou algumas falhas no processo, entre elas os depoimentos assinados por My Friend e Cabeleira, os executores, com data de 9 de abril, quando os mesmos tinham sido presos no dia 12 de abril.
Após 17 horas, já na manhã do dia 22 de junho, foi proclamado o veredito e Moura Rocha foi absolvido por 6 a 1. Cabeção, um dos executores do crime, foi penalizado com 22 anos de prisão, reduzida para 19 anos. Cabeleira e My Friend tiveram os julgamentos adiados. O primeiro sob a legação que estava doente e o segundo por divergência na escolha dos jurados.
O Ministério Público interpôs recurso e novo julgamento foi marcado. Este foi encerrado no dia 15 de fevereiro de 1967, com José Moura Rocha sendo absolvido pela segunda vez, desta feita por unanimidade do júri.
O julgamento teve a presidência do desembargador Eraldo Castro Vasconcelos. Ao final, Moura Rocha foi aplaudido de pé pelos presentes. Atuaram na defesa os advogados José de Oliveira Costa, José Ribeiro da Costa, Antônio Aleixo e o professor Oscar Stevenson. Na acusação estavam os advogados Antônio Uchoa e João Uchoa.
Moura Rocha, após deixar a prisão, saiu de Alagoas. Avaliou que não tinha mais condições de exercer a advocacia em sua terra natal e, junto com a família, foi morar em Brasília. “Cercearam-nos toda a atividade profissional. Açularam os preconceitos da sociedade local contra nós e nossa família, tornando-nos um réprobo”, desabafou.
Queima de arquivo
Comprovando que existiam interesses outros no crime de Tininho, em 19 de novembro de 1966, aproximadamente três meses antes do segundo julgamento de Moura Rocha, quando já se dava como certa a sua absolvição, teve início uma série de mortes que foram tratadas pela imprensa da época como “queima de arquivos”.
A primeira vítima foi Cabeção. Segundo Moura Rocha, ele havia repassado dinheiro a Cabeleira para que matasse My Friend. Como o contratado não fez o “serviço”, houve uma discussão entre eles e Cabeleira foi esmurrado pelo contratante. Na manhã seguinte, dia 19 de novembro, Cabeleira entrou na cela onde Cabeção e My Friend tomavam café e voltam a discutir. Cabeleira diz “que era homem”, sacou de revólver calibre 38 e disparou toda a carga em Cabeção.
No final da manhã do mesmo dia, quando o secretário de Segurança, coronel Adauto Gomes Barbosa, já tinha aberto inquérito para apurar as causas do crime e descobrir como o revólver chegou até as mãos do Cabeleira, um novo crime aconteceu na mesma Cadeia Pública de Maceió. My Friend foi cercado no pátio da prisão por um grupo de presos e atingido por catorze golpes de faca e um tiro de pistola 22.
Diante da clara situação de “queima de arquivos”, o coronel Adauto Gomes de Barros foi ao presídio, mandou recolher todo o corpo da guarda ao Quartel e ocupou a Cadeia Velha com homens armados de metralhadoras. Poucas horas depois já havia um suspeito pela morte de My Friend: um detento de nome Cícero Espinhoso foi encontrado com um tamanco ensanguentado.
Cabeleira foi recolhido a uma das celas do Quartel Geral para ter sua vida preservada. Depois foi transferido para Marechal Deodoro e em seguida para um presídio no Rio de Janeiro, onde também foi assassinado.
Vinte e dois dias depois dos crimes, a investigação pouco tinha avançado, mas já se tinha a “culpabilidade parcial do sargento responsável pela guarda e de um soldado”, como informou o Diário de Pernambuco de 11 de dezembro de 1966, que também registrou a incapacidade policial em descobrir como as armas entraram no presídio.
Moura Rocha, temendo por sua vida na prisão, solicitou a intervenção do ministro da Justiça Medeiros Silva. O pedido foi assinado por seu defensor, professor Oscar Stevenson, e o ministro enviou telegrama, no dia 14 de dezembro, ao governador Lamenha Filho exigindo garantias de vida para o detido, que naquela data aguardava o segundo julgamento.
No dia 25 de dezembro, foi divulgado o resultado do inquérito que apurou a morte de Cabeção. O corregedor Danilo de Freitas Cavalcante pediu a prisão preventiva de cinco pessoas. Eram quatro militares — que já tinham sido expulsos da PM — e um irmão de Cabeleira. Entretanto, não se descobriu a origem das armas e nem o que levou Cícero Espinhoso a matar My Friend.
Recomeçando
Estabelecido em Brasília com a família a partir de fevereiro de 1967, Moura relutou em retomar a advocacia. Mas não tinha outra profissão e precisava manter a família.
Incitado por dois alagoanos — advogado José Camelo da Costa Júnior e Oséas Cardoso, ex-deputado federal — montou escritório e passou a defender os interesses de importantes empresas do país, entre elas, algumas de Alagoas.
Trabalhava de forma “bem remunerada”, como admitiu. Representava “dezenas e dezenas de ilustres colegas, perante os Tribunais Superiores, sediados na Capital”.
Dez anos depois, a mosca azul da política voltou a picá-lo. “Aos quarenta e cinco anos de idade, o amadurecimento político não chegara totalmente”, reconheceu autocriticamente.
Convidado pelo então deputado federal José Costa, aceitou disputar uma das vagas de senador por Alagoas. A outra seria entregue “bionicamente” a Arnon de Melo. “Santa estupidez. Aceitamos”, comentaria muitos anos depois.
Em 1978, Moura e Vinicius Cansanção eram os candidatos do MDB ao Senado, e enfrentariam a chapa da ARENA formada pelo Major Luiz Cavalcante (tentava a reeleição), Rubens Villar e José Sampaio, então deputado federal.
Vinicius Cansanção, após o prazo que permitiria substituições, desistiu da candidatura, deixando seu correligionário sozinho contra três pretendentes à cadeira senatorial. Moura revelou que as vésperas da renúncia o viu num reservado do restaurante da Motonáutica, no Pontal da Barra, a conversar com Theobaldo Barbosa, presidente estadual da ARENA e antigo auxiliar de Arnon de Melo.
Os eleitores deram 157.703 votos a Moura. Luiz Cavalcante recebeu 117.302 votos, Rubens Villar conseguiu 51.402 votos e José Sampaio, 21.024. Foi vencido pelo somatório dos votos das duas sublegendas. A ARENA, com esse artificio, conseguiu 189.728.
Derrotado eleitoralmente, mas vitorioso moralmente, Moura voltou a Brasília para mais uma vez recomeçar. Entretanto a “atividade profissional escasseara” e uma hérnia de disco passou a torturá-lo. “Felizmente os filhos, passados esses tumultuados anos, deram largos passos nos estudos; haviam amadurecido”, exaltou.
“Fomos levados a alugar a casa que construíramos numa área de mansões em Brasília. Seria mais econômico e renderia um bom aluguel, para ajudar a abalada finança familiar”, lembrou Moura.
Andanças com o Menestrel
Ainda sofria com as dores provocadas pela hérnia de disco, quando recebeu a visita do velho senador Teotônio Vilela. Entretanto, a conversa não ficou somente em assuntos vertebrais. O experiente político viçosense queria que Moura fosse o candidato ao governo de Alagoas nas eleições de 1982.
Vilela, que tinha deixado o PDS no dia 25 de abril de 1979, seria o candidato ao Senado pelo PMDB embalado pela pretensão de chegar à presidência da República na primeira eleição que ocorresse após o fim do regime ditatorial, que enxergava próximo.
Após uma delicada cirurgia, Moura voltou a Maceió e mergulhou de cabeça na campanha que entraria para a história, principalmente pelas circunstâncias especiais que envolveram Teotônio Vilela.
Agora o embate era entre o PMDB, que ganhou estrutura com a presença de Vilela, e o PDS de Divaldo Suruagy, que ainda cambaleava após perder o ilustre senador para a oposição.
Parecia que tudo ia bem, quando, em maio de 1982, a cúpula do PMDB nacional convocou uma reunião em Brasília e nela, com a presença de Ulisses Guimarães e Miguel Arraes, foi anunciado que Teotônio Vilela estava se afastando da campanha definitivamente por recomendação médica.
Tinha nódulos cancerosos no pulmão e no cérebro. Teotônio se referia à doença, apontando para o peito e dizendo que era um “bichinho solerte que está roendo aqui dentro…”.
Sem Teotônio, o PMDB alagoano avaliou que a candidatura de Moura ao governo não fazia mais sentido, pela dificuldade que teria em conseguir recursos. Apresentaram o nome do então deputado federal José Costa. Moura foi convidado a disputar novamente uma vaga no Senado.
Mesmo com Teotônio tendo alguma participação na campanha, o PMDB foi derrotado. Divaldo Suruagy foi eleito com 257.898 votos contra 206.856 dados a José Costa. Guilherme Palmeira teve 259.581 votos, vencendo Moura Rocha que conseguiu 202.573 votos.
A partir de 1983, Teotônio utilizou suas últimas forças para divulgar o Projeto Emergência. Em novembro de 1983, entrou em coma em São Paulo. Foi levado para Maceió, onde morreu em casa, às 16h40 do dia 27 de novembro de 1983.
Moura, após o processo eleitoral de 1982 e uma tentativa de chegar à Constituinte em 1986, quando já estava filiado ao PDT, somente voltou a se aproximar da política alagoana em fins de 1992, quando foi contratado pelo presidente Fernando Collor de Melo para defendê-lo diante a da ameaça de impeachment.
No dia 28 de dezembro, em um jantar com Collor, o presidente apresentou a ele uma carta do advogado Evaristo de Morais Filho, recomendando a sua renúncia para não sofrer o impeachment.
Indagado se existia alternativa, Moura respondeu:
— Imediata, não vemos. Só se for adiada a sessão, presidente.
Moura concordava com Evaristo. “As cartas estavam marcadas”, escreveria mais tarde.
Foi autorizado então a preparar a carta renúncia, que foi redigida por Octaciano Nogueira e lida por Moura Rocha durante a sessão do Senado do dia 29 de dezembro de 1992.
Não adiantou a renúncia. No dia seguinte, por 76 votos a favor e 3 contra, Fernando Collor foi condenado. Perdeu o mandato e foi declarado inelegível por oito anos.
Poucos anos depois, Moura e Ibelza deixaram Brasília e foram morar no pequeno, mas aprazível Sítio Santa Mônica em Ipioca, na fronteira norte de Maceió, onde recebiam amigos e passaram os últimos anos de suas vidas.
Em 2011, no dia 29 de agosto, Ibelza faleceu em Brasília, vítima de câncer. No dia 3 de março de 2012, seu filho Breno Moura Rocha, com 49 anos de idade, também perdeu a vida vítima de um acidente com sua moto na rodovia AL 101 Norte.
Desde então, Moura vinha administrando, com valentia, o sofrimento por estas perdas. Faleceu na noite de 26 de maio de 2019 deixando um imenso legado de coragem e dedicação as mais nobres causas da justiça social.
Obra:
Os Pobres Não Tugem e os Ricos Não Mugem, Brasília: Ed. Dédalo, 2003;
Baleeiro: Justiça Apesar da Ditadura, Brasília: Ed. Dédalos, 2005. Artigo em periódico:
Reforma Jurídica, in Revista Letras Jurídicas, Maceió: Imprensa Oficial do Estado, ?, Ano 2, nº 4, p. 35-40.
Saudações Edberto Ticianeli!!
Parabéns pelo o resgate da história alagoana. Muitos destes fatos ocorreram antes mesmo do meu nascimento, mas estes relatos me ajudam a compreeender a conjuntura política alagoana, bem como sua história.
Parabéns, Ticianele!
Um rico relato sobre a vida desse ilustre alagoano. Moura Rocha, a seu modo e tempo, teve uma atuação valorosa na construção de nossa identidade política.
Parabéns pelo relato dessa bela história .
Parabéns, Ticianeli, por esta narrativa de mais um alagoano que merece todo o nosso apreço, pela sua história sempre ligada à justiça.
A candidatura de Abraão Moura ao governo do Estado foi em 1960- na Sucessão de Muniz Falcão e não em 1961. Neste pleito de 1960, o ” Major” Luiz Cavalcante foi eleito Governador, embora no interior o
Corrigi, Célio Rebelo. Obrigado pela observação. O próprio Moura em seu livro cometeu este erro.
Parabéns pela exatidão do relato. O Dr. José Moura Rocha foi um Grande Guerreiro. Sou alagoano, de Capela, e tenho a honra de te-lo como primo legítimo, apesar do pouco contato, por residir no Rio de Janeiro desde 1971. Acompanhei toda sua vida. Mereceu esse DESTAQUE por ter sido um GRANDE ALAGOANO e baluarte neste pais.
P A R A B É N S. !!!
Sou Nilton José Moura Bitar primo legítimo filho de Marieta Moura Bitar irmã de viraria Moura da Rocha antes ambas Araújo Moura. O acompanhei desses de muito tempo mesmo sem concordar com a sua forma de fazer política pois tinha na mente que eleição se ganhava com dignidade isso tinha para sobrar mas a realidade era outra e assim foi massageando seu ego em companhia de sua mais guerreira que o próprio guerreiro, Ibelza Barbosa Moura Rocha. Teimosia a prova é nos lá em seu escritório na praça Sininbu tivemos vários desencontros de ideias mas conseguia juntar grande parte dos MOURA sua real família a acompanha-lo politicamente mesmo cada um pagando seu próprio prato e sua bebida no hotel Matusubara para arrecadar contribuição para continuar o mínimo que gastava-se em uma campanha. Bruno e Bolivar hoje ainda são a prova. Parabéns Primo, Amigo e grande representante da família de seu Né Brandão Moura e D. Vaquinha. Ou Maria Lídia seus avós maternos. Deixo aqui o meu testemunho de uma pura verdade de um homem íntegro, ilibado e Conspicuo. DR. José Moura Rocha.
História que dar gosto de ser lembrada pela riqueza de detalhes. Parabéns pelo resgate. José Moura Rocha, membro de nossa família, guerreiro e autor de capítulos antes vividos por outra em nossa política alagoana e a nível nacional. Descanse em paz velho guerreiro!!!!
Matéria muito boa. Todos nós da família Moura, vivemos parte dessa história. De qualquer maneira sentimos pelas histórias de nossos pais, tios, tias, primos o imenso orgulho de ter um parente guerreiro, competente, ilustrando a história política do nosso Brasil
Aqui vai mais um comentário: A última vez que vi o Dr. José Moura Rocha foi no aniversário de 90 anos de minha mãe, D. Aurelina de Souza Moura (D. Lela), em 2010, na casa do Dr. Gerson Odilon Pereira e de minha irmã Maria Celina Moura Pereira, na Barra Nova. Tínhamos naquela época cerca de 300 pessoas, entre elas, o Dr. José Moura, sua esposa Ibelza, e dois de seus filhos. Os cumprimentei rapidamente, conversamos muito pouco, haja vista a quantidade de irmãos, de primos e demais parentes convidados.
O Dr. José Moura Rocha teve uma vida proba e altamente voltada para suas ideologias, sempre em prol das pessoas, tanto de seu relacionamento pessoal quanto de seus eleitores…
Parabéns à queles que conviveram com o Grande Menestrel das Alagoas Teotônio Vilela. Estes só tiveram suas vidas regradas e voltadas para o bem da humanidade. Entre eles o Guerreiro Dr. José Moura Rocha…
Obrigado mais uma vez, caríssimo Ticianeli, por esse competente relato que muito honra a história de nosso pai – e também de nossa mãe; enfim, do casal Moura e Ibelza. Que bom ler aqui comentários de primos, alguns dos quais sequer conheço pessoalmente; e de pessoas valorosas que conviveram com meu pai. Saudações a todos.