Alagoas e o 7 de Setembro de 1822

Desfile de 7 de Setembro de 1940 na Praça Deodoro

Desfile Militar na Praça da Faculdade

A tentativa das Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, também conhecida como Soberano Congresso, em fazer o Brasil voltar a ser uma colônia portuguesa encontrou fortes reações no reino brasileiro a partir de 1820.

Não se admitia perder os benefícios que vieram juntos com a transferência da corte para o Brasil no início de 1808.

As transformações políticas, econômicas e sociais ocorridas foram tantas e tão rápidas que levou o Príncipe Regente D. João a elevar o Brasil a condição de Reino Unido em 16 de dezembro de 1815.

Com a volta da família real a Portugal, em 1821, D. João nomeou seu filho, D. Pedro de Alcântara de Bragança, como Príncipe Regente do Brasil. Não demorou e o jovem regente passou a sofrer pressão para que ele também retornasse a Lisboa para com isso se restabelecer o antigo estatuto colonial.

Após os acontecimentos de setembro e a decisão de D. Pedro de declarar a independência no dia 7 daquele mês, o futuro imperador — proclamado como tal em 12 de outubro de 1822 — passou a receber várias delegações das Províncias, entre elas ouviu o apoio de representantes de Alagoas, como registrou o jornal Gazeta do Rio em 1º de outubro de 1822.

Discurso de José de Souza e Mello

Desfile Militar nos anos 70 na Av. da Paz

Discurso análogo às circunstancias do Reino do Brasil, e do Príncipe Regente seu perpétuo Defensor, e Protetor, por ocasião de sua Aclamação, feito e recitado publicamente ao Mesmo Augusto Senhor pelo Secretario Enviado da Província das Alagoas.

Senhor. — Transportando-me ao maior auge e júbilo e de glória, e cheio de profundo acatamento, eu venho hoje ratificar publica, e solenemente perante V. A. R., e toda a Corte os protestos de homenagem, gratidão e obediência, que da parte da Província das Alagoas, tive a honra de apresentar a V. A. por meio da Audiência particular, que Se dignou prestar-me no dia 19 do corrente. Os Povos, as Câmaras, e a Junta do Governo Provisório daquela Província me constituíram a tal respeito seu Representante, como consta do Diploma da minha honrosa Comissão, e dos Ofícios, que tenho entregado pelas Repartições competentes. O ter eu defendido os direitos dos Cidadãos no emprego de Advogado, que ali publicamente exerci por alguns anos, e o haver sido elevado pela respectiva eleição a Membro do mesmo Governo, em que tenho servido, e sirvo atualmente na qualidade de Secretario da Junta, foi sem duvida o motivo de me julgarem todos os meus comitentes com especial aptidão para empresa, de que não sou digno. Com tudo eu tratarei agora tosca, mas explicitamente do objeto, de que estou encarregado, deixando de tecer o justíssimo elogio de V. A. R., por não misturá-lo com a lisonja e adulação, que os Príncipes Magnânimos abominam.

Era já tempo de intimar o Soberbo Brasil a Portugal a sentença e titulo de sua liberdade e grandeza, de que o mesmo Portugal o espoliara; era tempo de conhecer Portugal que o impávido Brasil soube penetrar, e descobrir que os alaridos levantados entre o Douro e Tejo desde de Agosto e Setembro de 1820, com o especioso titulo de Constituição Politica da Monarquia, e que como tal ligarão aceleradamente o mesmo Brasil, depois de encerrarem desafogo particular, e desforço dos raivosos do velho Mundo, degeneravam em contrato Leonino, contrato claramente conhecido quando na partilha dos interesses Nacionais Portugal arrebata para si o Rei, os Cofres, as ricas produções alheias, o centro de união, o poder de subjugar, e o voto absoluto, e sempre vencedor de seus Deputados: quando manda imperiosamente que o Brasil extensíssimo, muito mais rico e produtor, e muito mais seguro, e defendido fique recolonizado, sem Rei, sem Leis próprias, sem tesouros, sem o centro de união, sem liberdade e sem defesa e segurança, senão aquela que Portugal arbitrava experimentara duplicadas vezes o ódio novercal; quando (abstraindo do motivo porque se decretarão tripartidos os Governos Provinciais) se observam nomeados para todas as Províncias os Governadores das Armas, sem ser contemplado um só Militar Brasileiro: quando finalmente aparece o bárbaro procedimento das Cortes de Portugal contra a Excelsa Família de Bragança, que, sem mais crime do que a elevação do Brasil á Categoria de Reino, e ponto central em premio de havê-lo recebido na crise mais lamentável  com os braços abertos entre lagrimas de prazer, e maravilhosos aplausos, tem sofrido que elas impusessem ao Augusto Pai coação, e restrições melindrosas no tempo de uma Constituição liberal, sem se lhe ter conhecido abusos, e ao Incomparável Filho a ordem de viajar por Países estrangeiros; esse desmascarado ostracismo politico na mesma época, em que se proibia que a pena do delito fosse transcendente! Horrível tenacidade! E não bastava a insultante aprovação de lhe desobedecer o Governo da Bahia antes de estar revogada, ao menos por decência, a Lei que o constituiu Regente do Brasil? É por termos tão férreos, que se sanciona o desprezo á mais Alta Dignidade deste Reino, mesmo quando se recomenda respeito inviolável a todas as Autoridades Constituídas? Com efeito, Senhor, o Brasil debaixo de um consenso presuntivo pelo fato lícito de necessidade, e utilidade, na direção do axioma — negotiorum gestio — tinha o direito á reclamação de tantos ultrajes, que revertiam todos em seu dano; mas ele carecia de um Herói, que fundado naquele principio erigisse a muralha de sua segurança.

Eis que V. A. R., ou naquela qualidade, ou na de legitimo herdeiro da Monarquia se dignou aceitar, e promover a felicidade Brasiliense, eis que fez espedir as Ordens análogas às circunstâncias, eis que os mesmos chegam a Província de Alagoas. Ali não são elas postas em discussões publicas, não se observam procrastinações criminosas, mas sim as que tendiam a desvanecer o terror pânico procriado pelos satélites lá desse hemisfério usurpador: tudo se persuade que a salvação, e a comodidade do Povo é a Lei Suprema: o Povo e o Governo reconhecem o seu Inclícito Benfeitor, e desejam ser-lhe gratos.

Desfile Militar nos anos 70 na Av. da Paz

A Província das Alagoas, sim, que sempre marchou briosamente nos seus movimentos políticos, sem ser jamais teatro da guerra civil, e d’anarquia, que tem grassado pela maior parte das Províncias Brasílicas, aceitou, e cumpriu religiosamente as ordens demandadas de V.A. R. em beneficio da nova causa do Brasil; e, querendo redobrar seus puros reconhecimentos, dispôs, promoveu, e pôs em pratica a Aclamação de V. A. R. como Príncipe Regente, e Perpétuo Protetor do Reino do Brasil, celebrada em paz, e solenemente na Capital aos 28 de Junho deste ano, e consecutivamente nas demais Vilas da Província: demitiu, e enviou para Portugal todos os Portugueses Europeus empregados Civis, e Militares, e os particulares não aderidos a tão justa causa, intimando o mesmo destino aos que ainda se mostrassem dignos dele: lançou mão de todos os meios de segurança, criando corpos, e reunindo forças em Nome de V. A. R., cuja Aprovação invocara, com fim de resistir firmemente a todas as tentativas funestas, É ali, Senhor, que aparece em ultimo ponto o valor e coragem: tudo ali treme à voz dos Alagoanos; nem os aterra o estado ou furioso, ou duvidoso de seus inimigos expelidos, nem o de seus vizinhos armados, nem os horrores, com que a Europa cada dia ameaça o Brasil por meio de seus entusiastas, que se julgam os únicos Senhores de todos os atributos de Marte: eles oferecem seus peitos valorosos, como muros inexpugnáveis a todos os tiros, e com tanto que retumbe perpetuamente pelo mundo inteiro o triunfo do Brasil, e a gloria de V. A. R.

É assim que na Província das Alagoas se pensou, e se praticou livremente, é de tal maneira que nas Alagoas se olhou o procedimento das Heróicas Províncias coligadas do Sul. Em testemunho pois destas verdades tantas vezes ali juradas, eu venho destacado do Corpo da Junta protestar pessoalmente, como de facto protesto, e juro por aquela Província a mais rigorosa obediência, e adesão a V. A. R. a Sua Alta Prole, e ao Congresso Brasílico próximo a instalar-se: venho tributar a V. A. homenagem, e muito submissas, e Cordiais gratificações por tantos Feitos Gloriosos, e Benéficos: venho finalmente declarar que a dita Província reconhece o Soberbo Brasil em estado de não temer senão a si mesmo; e que este vastíssimo Império, e seu Majestoso Defensor, e Protetor se fazem mutuamente credores de mais elevadas Categorias, cujo impulso eu devo dar, ou coadjuvar.

Eis-aqui, Senhor, os puros votos de meus Constituintes, os Sentimentos da Província inteira das Alagoas, os quais eu enviado, revestido do Carácter de Brasileiro intrépido, reforço com meus próprios, e particulares protestos: eis-aqui minha honrosa Comissão verificada, depois de viagem retardada por inconvenientes vencidos. Resta-me somente que o Brasil inteiro, que os famigerados Pernambucanos, cujo brio, e patriotismo inexplicável eu presenciei há pouco: que os mesmos denodados Baianos oprimidos por um Déspota armado me ajudem a proferir incessantes Vivas ao Grande Pedro do Brasil e Sua Adorável família, ao novo Império que Ele protege, e à Santa Religião que professamos. Rio de Janeiro no Paço aos 17 de Setembro de 1822. — O Secretario Enviado da Província das Alagoas, José de Souza e Mello.

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