Félix de Vandesmet, o Barão francês da Brasileiro

Barão de Vandesmet, de barba branca

Nascido no norte da França em 6 de maio de 1848 e registrado como Félix Eugene Vandesmet, era filho de Adolphe Antoine Aimable Vandesmet (4 de agosto de 1817 – 9 de novembro de 1898) e da filipina Flore De Capol (1822-1888). O casal teve cinco filhos: Adolphe, Félix, Laure, Gustave e Gaston.

Adolphe Antoine, em 1852, instalou uma fiação para produzir fios de linho em Watten, Rua de l’Ermitage, Poucos anos depois, em 1865, já tinha erguido um prédio na Rua de la Gare para trabalhar com juta. Funcionou até 1977.

Fiação Vandesmet em Watten, na França, entre 1915 e 1917

Félix de Vandesmet teve formação profissional na Escola de Artes de Paris, onde aprendeu a dominar os princípios da Mecânica e se tornou Engenheiro.

Foi contando com esse aprendizado e a experiência do pai nos negócios, que muitos anos depois o futuro Barão de Vandesmet escolheu as terras férteis de Atalaia para implantar, em 1891, a Usina Brasileiro, a primeira usina de açúcar de Alagoas.

Barão de Vandesmet nasceu na França

Quando chegou ao Brasil, já trazia a experiência de ter explorado uma unidade industrial semelhante em Guadalupe, nas Antilhas, em sociedade com um amigo.

Em 1879, chegou ao Rio de Janeiro após um breve período na França, para onde retornou das Antilhas para tratar da Febre Amarela. Procurou o imperador Dom Pedro II em sua residência de verão em Petrópolis. Precisava de investimentos para seus negócios, mas nada conseguiu.

Foi para a Bahia e lá, em sociedade com o coronel José Freire de Carvalho, dr. Augusto Chaves, Conselheiro Saraiva e outros, colocou uma “fábrica central de açúcar” para funcionar no dia 18 de novembro de 1880. Era a segunda usina daquela província e foi instalada em Pojuca. Vandesmet era o gerente da companhia e foi o responsável pela montagem da indústria.

Desentendeu-se com os proprietários e resolveu investir no município do Pilar, em Alagoas, na época o mais importante empório comercial do interior.

Lá, em 1885, numa sociedade com o seu irmão Gustavo e com John H. Boxwell, montou uma destilaria.

O Barão de Vandesmet esteve nas Antilhas antes de vir para o Brasil

Uma nota publicada no Jornal de Recife de 5 de janeiro de 1886 revela que naquela data havia uma solicitação de registro na Junta Comercial de Pernambuco para que fosse arquivado o contrato de sociedade entre John H. Boxwell & Cia e Felix Vandesmet, “sendo este solidário e os suplicantes comanditários, sob a firma Felix Vandesmet & Cia, com capital de 65:000$000, sendo o fundo em comandita de 20:000$000, para a continuação do comércio da fábrica de destilação, estabelecida na cidade do Pilar, província das Alagoas, sob a denominação Destilaria de Pilar”.

Ainda no Pilar tentou montar uma Usina Central. Com tudo acertado para o empreendimento, apresentou o projeto de interligar, por via férrea, essa Central à cidade de Satuba, onde haveria sua integração com a rede ferroviária existente. Essa proposta não foi bem vista pelos comerciantes e investidores que lucravam com os serviços de transportes pela Lagoa Manguaba do Pilar até Maceió. A Central foi inviabilizada.

Vandesmet não desistiu do seu projeto e no final daquela década já estava em Atalaia, município vizinho, iniciando a montagem da mais moderna usina de açúcar do Estado em terras de um antigo engenho, que adquirira para esse fim. Todos os equipamentos foram importados da Europa, onde existia as mais avançadas tecnologias do ramo açucareiro.

A construção foi demorada. Os navios com os equipamentos tinham que fazer a lenta e perigosa travessia do Atlântico e após chegar ao Porto de Maceió, o maquinário seguia pela Estrada de Ferro Central de Alagoas e depois transportados para as obras da usina no antigo Engenho Olho D’Água.

Vista parcial da Usina Brasileiro

A usina teve várias denominações. Como empresa individual Félix Wandesmet a Usina Brasileiro existiu desde a sua fundação até 21 de outubro de 1922, quando passou a se chamar Usina Brasileiro Wandesmet & Cia. Foi vendida ao Grupo Berardo Carneiro da Cunha e em 1º de dezembro de 1933 sua razão social passou a ser Usina Brasileiro de Açúcar e Álcool S. A., tendo em sua direção Agenor Berardo Carneiro da Cunha, Oscar Berardo Carneiro da Cunha Filho e Ernani Berardo Carneiro da Cunha.

Usina pioneira

A sua primeira moagem foi no dia 18 de janeiro de 1892 e passou a produzir uma safra de 4.000 sacas de açúcar, atingindo posteriormente a mais de 300.000.

O açúcar seguia para o Pilar e depois, em embarcações lacustres, para o Porto de Maceió.

A instalação primitiva da usina ficou sob à responsabilidade do mecânico João Siqueira, pai dos jornalistas atalaienses Valdir e Valmir Calheiros de Siqueira.

Montada inicialmente com um motor de 90 HP e 8 turbinas, sofreu reformas em 1905 passando a moendas de tríplice pressão – três motores de explosão a óleo diesel, de fabricação inglesa (Blackstone) e dois de fabricação tcheca (Esokad) comprados a COTRIMONTE.

A instalação destes motores coube ao mecânico João Monteiro Malheiros, conhecido por João Dezenove, por ter perdido um dedo da mão por acidente.

Barão de Vandesmet em uma reunião na Associação Comercial

É do Barão de Vandesmet, também, o empreendimento que construiu um ramal da estrada de ferro de Atalaia até a Usina Brasileiro. Para isso teve que construir uma ponte sobre o Rio Paraíba. Com a estrada de ferro pronta, Vandesmet comprou duas locomotivas e as batizou de França e Brasil.

Em 23 de outubro de 1905, a Estação Sapucaya, que fazia parte da linha privada entre a Usina e Atalaia, foi aberta ao serviço público para o transporte de mercadorias pelos trens da “Great Western”.

A Usina Brasileiro passou a se constituir num modelo de empreendimento industrial para a sua época.

Na área de saúde, foi instalada uma farmácia que importava medicamentos da França. Médicos de renome daquela época passaram por lá.

Família Vandesmet em um vagonete da Usina Brasileiro

O Barão foi o primeiro a usar em Alagoas a irrigação de fazendas através de motor a gás pobre (lenha). Instalou um telefone à manivela para a sua comunicação entre a Usina e Atalaia.

Foi ele também quem introduziu em Alagoas as variedades de cana de açúcar: Demerara, Barbados e White Transparent.

A cana produzida na Usina Brasileiro era de tão boa qualidade que em 1913 o Governo Federal adquiriu dela milhares de sementes e as remeteu para todos os estados produtores do país, inclusive para Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro.

Barão de Vandesmet e familiares

Outro avanço para a época foi a instituição da aposentadoria dos empregados. Reserva-se parte do lucro da usina para garantir o salário integral a todos aqueles que chegavam à idade de se aposentar.

Não existia legislação trabalhista no Brasil, mas Vandesmet implantou a sua própria, sendo reconhecido em todo o país por isso.

O então presidente Afonso Pena, atraído pela fama da Brasileiro, fez uma visita à usina e provou da aguardente lá fabricada, que ele próprio rotulou de “uísque Vandesmet”.

Moeu pela última vez na safra de 1957/58 com uma produção de 36.562 sacas de açúcar demerara e 700 de açúcar cristal.

O título de Barão lhe foi conferido pela Santa Sé por solicitação do bispo de Alagoas, D. Joaquim de Almeida, “por serviços relevantes à causa católica, entre as quais a fundação e manutenção de uma capelania (na Usina Brasileiro) e de um excelente colégio dirigido pelas irmãs Sacramentinas” (Colégio Sacramento de Maceió), como informou o jornal A União (RJ) de 7 de março de 1915.

Passou a ser o Baron du Saint Siége Félix Eugène Wandesmet, ou o Barão da Santa Sé Félix Eugène Wandesmet.

Na solenidade de entrega do título discursaram o bispo e o dr. Costa Leite. O Barão agradeceu e comungou em companhia de várias alunas do Colégio Sacramento que faziam a primeira comunhão.

Em 16 de agosto de 1929, aos 81 anos, morreu o Barão de Vandesmet, que também foi o Cônsul da França em Alagoas. Deixou viúva d. Luiza Almeida Bérard Vandesmet e quatro filhas: Sonia, Yvone, Gastonne e Flora.

Em 1933 a Usina Brasileiro foi vendida ao empresário Oscar Berardo.

Fonte principal site Atalaia Pop.

Usina Brasileiro

17 Comments on Félix de Vandesmet, o Barão francês da Brasileiro

  1. Muito bom! Legal saber que um usineiro lá atrás se preocupava com seus funcionários. Essa criação de aposentadoria para os funcionários foi um acontecimento relevante da época… Vida eterna Barão de Vandesmet!!!

  2. michel le campion // 5 de junho de 2015 em 09:34 //

    Vejam vocês que importância histórica a atitude desse homem em montar uma industria de base em nosso estado, quantas famílias deixaram de passar fome por isso, e quantas tiveram o pão de cada dia, quantos empregos foram gerados naquela época, em um estado pobre como o nosso, quantas outras indústrias vieram instalar-se por essa atitude!! E agora??

  3. Esta história está imprecisa, pois se é que quem montou os motores foi João XlX, que nós conhecemos, já tinha nascido, no máximo era criança em 1905. Era o avô da Cinthia mulher do Theo Vilela e foi mecânico da usina de meu avô, Osman Loureiro. Acredito que quem mountou foi Charles Dorvillé, francês mandado pela Fiveslille para isso, que se radicou em Alagoas, e veio a ser pai da minha avó Laura Loureiro.

  4. Ticianeli // 5 de junho de 2015 em 15:59 //

    Caro Astério Loureiro,
    Agradecemos pela informação. A nossa fonte foi o professor Carlos Tibúrcio de Araújo Abreu, no site http://www.atalaiapop.com/paginas/historia/historia4.html#sthash.gy6XJQ5v.dpuf.
    Vamos procurar outras fontes para corrigirmos a imprecisão.
    A sua informação de que quem montou foi Charles Dorvillé, já vai nos ajudar muito.
    Obrigado por valorizar o nosso trabalho com as suas obervações.

  5. mario braga // 7 de junho de 2015 em 07:44 //

    É preciso repensar o papel da indústria açucareira na nossa economia,
    principalmente o processo tributário.

  6. Adriano Flávio Santos da Rocha // 30 de junho de 2015 em 01:07 //

    Sensacional trabalho histórico. Estão de parabéns

  7. Carlos Tadeu Morais de Melo // 28 de julho de 2015 em 12:09 //

    Cada vez que me debruço sobre a história da Usina Brasileiro, a emoção é inevitável. Não tive a oportunidade de vê-la moendo. Mas minha família, capitaneada por meu avô, Sr. Antonio Carlos de Morais, viveu boa parte da história ligada a essa Usina. Passei, quando criança, minhas férias escolares na usina, isso na década de 70, dias agradáveis, ainda com a casa grande de pé, uma coisa linda, o bangalô, a rua nova, o cinema, o mercado, o açude, as duas locomotivas, a barragem, o sítio de mangueiras em frente a casa grande, o pé de jabuticaba nos fundos da casa grande. Perdi meu pai, isso em 24 de março de 2012 e no mês de junho do mesmo ano, voltei a Usina e lamentei pelo estado em que a mesma se encontrava. A casa grande não existe mais, um crime cultural, as locomotivas cobertas pelo mato. Vou parar, pois o coração já está acelerado, uma vez que daqueles dias inesquecíveis, muitos dos que amamos tanto já não estão entre nós. Espero que as autoridades busquem meios de preservar,no mínimo, a história da Usina Brasileiro de Açucar e Álcool S/A.

  8. José Otávio Costa // 17 de fevereiro de 2016 em 20:32 //

    Ticianelli e equipe, parabéns pelo magnífico trabalho. Sempre me emociono quando leio os textos. Viva Alagoas !

  9. Antonio de Padua // 17 de fevereiro de 2016 em 22:29 //

    Queria saber qual foi o motivo do fechamento da Usina Brasileiro.

  10. Gustavo Adolfo S Vandesmet // 24 de fevereiro de 2016 em 17:29 //

    Muito bom trabalho parabéns. É gratificante saber que a historia deste nobre homem será preservada e lembrada como uma pessoa de pensamentos e atitudes revolucionarias para sua época. E poderá servir de inspiração para muitos brasileiros.

  11. Alexandre Márcio Toledo // 6 de julho de 2020 em 00:22 //

    Excelente relato, parabéns!
    Se a estação ferroviária de Atalaia foi inaugurada em 1891, não teria sido mais provável que o escoamento da produção da Usina Brasieliro se desse pela E. F. Central de Alagoas (1891-1903)? Apesar da proximidade da Usina com a foz do rio Paraíba do Meio, que desemboca no município do PIlar.
    A esposa do barão não se chamava Luiza Almeida Bérard?
    Sugiro escrever também sobre a origem da Usina Capricho, no atual município de Cajueiro, atribuída ao irmão do barão, Gustave Eugéne Vandesmet, segundo Moacir Medeiros de Sant’Ana.

  12. Um cara veio de fora, para demonstrar que o Brasil era atrasado, e ainda continua sendo. Eita que vem desde dos tempos antigos o Brasil servir de chacota.

  13. ARTUR MACHADO // 10 de maio de 2021 em 20:21 //

    Parabéns por pesquisa tão importante para o conhecimento dos desbravadores da economia e evolução da nossa querida Alagoas, sugiro edição, sobre a história do surgimento da antiga Usina Cansanção de Sinimbú, para a economia também de Alagoas, e toda região de São Miguel dos Campos /AL.

  14. Rita de Cassia Alves Guimarães // 25 de maio de 2021 em 13:13 //

    Meu nome e Rita de Cassia Alves Guimarães , sou de Minas Gerais,mas moro atualmente no estado do Rio.Tinha um primo com o nome José Vandesmet, o pai dele se chamava Ernesto, a mãe dele, minha tia, era chamada por Salia; tinham outro filho chamado Phiuca. Sempre fiquei curiosa com este sobrenome, e hoje resolvi procurar sua origem na internet
    Realmente, a familia da minha avó Ana ,avó do Vandesmet vieram de Portugal e da França

  15. José Jorge matias da silva // 11 de setembro de 2022 em 18:29 //

    Gostei muito de ler as istorias. Antigas e bonitas do meu. Estado.

  16. Carlos Alberto Godoy Silva // 6 de abril de 2023 em 17:49 //

    Saudações, venho pesquisando sobre as fichas particulares usadas nas Usinas Brasileiros e Utinga Leão. se tiverem informações onde foram cunhadas, Europa? quantidades, aceitação e utilização dos funcionários e proprietários das referidas fichas.

  17. iracyrica@gmail.com // 19 de dezembro de 2023 em 02:11 //

    Ele morreu sem saber de um grande segredo

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